quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Uma palavra vale mais que mil imagens

As palavras, ao contrário do que prega o dito popular, podem construir cenários bem detalhados. E dizem muito, principalmente se ditas por um serzinho que ainda não as domina por completo, e que, portanto, escolhe as mais emblemáticas, comezinhas e repetidas para compor seu vocabulário.

Tirem, então, suas próprias conclusões com a lista abaixo:
bobagem
Árfur
não
dodói
chá
xixi-cocô-bumbum (nessa ordem!)
e...
colágeno

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Missão dada, missão comprida

Não, eu não escorreguei na grafia. É assim mesmo aqui em casa: missão dada, missão comprida.
Supermercado, lavar roupa, sair de casa, às vezes até mesmo ir da sala para a cozinha é uma lerdeza sem tamanho. Tem a novela das roupas, em camadas, muitas, que dão calor e irritam. Tem aquele brinquedo no meio do caminho, que se torna irresistível. Tem a vontade, agora verbalizada com a palavra favorita do momento: não! Tem isso, tem aquilo, e com tantas posses, tendo tantas coisas, fica mesmo difícil caminhar. Correr, então, nem pensar!
E assim vamos, um dia de cada vez, uma hora de cada vez, um minuto de cada vez, exercitando a paciência, maravilhosa qualidade que nunca fez parte do meu pacote arrasador de maravilhas, mas que ganha novas perspectivas sempre que eu penso que estou aqui para ele e por ele.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Mãe não é tudo igual

Nenhum discurso é neutro. Não se iluda: cada palavra proferida carrega uma ordem, uma visão de mundo, um recorte e valores. Podemos até escolher nossas frases e falas de maneira inconsciente, mas isso não quer dizer que elas sejam neutras ou descompromissadas com um viés político. Mesmo que você odeie política, seu discurso é quase uma entidade autônoma, anunciando com doze mil megafones o seu posicionamento político frente ao mundo.
Dito isto, preciso comentar os cartazes que andaram bombando na internet por esses dias.
Se você não sabe do que estou falando, não vou colocar um link, porque isso faria com que os tais cartazes tivessem ainda mais visualizações, do que, sinceramente, nosso mundo não precisa.
Pois bem, a primeira vez que vi foi quando uma amiga de Facebook postou o link, rindo-se horrores das falas sempre repetidas das mães. Depois veio outra. E mais outra. Todas com ensino superior completo, duas com mestrado até.
Depois a coisa se espalhou num crescente tedioso (todo viral é meio tedioso, já que você vê a mesma postagem umas doze vezes no dia). E todo mundo rindo, achando graça, compartilhando com as mãaes: olha aí, progenitora, o que você me falava!
Pois eu digo que eu achei terrível!
Além de feios, os cartazes servem a um propósito absolutamente apavorante e, de quebra, testemunham como as diretrizes da educação na minha realidade (classe média carioca, zona sul maravilha) não poderiam, como de fato não o fizeram, construir seres humanos mais humanos, engajados, críticos e empáticos.
O hedonismo da coisa começa na estética. O projeto é a esteticização de frases que ouvimos (sim, eu ouvi) das nossas mães. Quando você torna a coisa estética, você insere ela em outros valores. Então, além das palavras, temos nos tais cartazes o discurso reforçado pelos elementos visuais, que, em consonância com os padrões vigentes, nos dizem: olhem, tudo o que nos é dito pelas mães é uma regra, um mandamento lindo e maravilhoso de se ter como referência. Sim, porque é nisso que as tais imagens se constróem, referências. Quando se quiser, a partir de agora, reproduzir os discursos maternos ali estampados, a preferência vai ser pelos cartazes, porque além de estéticos (e afinados, como disse, com a estética vigente), eles são práticos, e se espalham com o simples clique num botão.
Aliás, o botão compartilhar do Facebook merecia um post a parte, mas vou poupar os meus parcos leitores dessa ladainha crítica e continuar com a digressão sobre os tais cartazes (ciente de que não se trata, porém, de menos ladainha crítica. Mas aqui o espaço é democrático e fica quem quer ler).
As peças são, ao mesmo tempo, chocantes, tristes e curiosos. Curiosos porque desde a essência captam valores embrenhados na nossa cultura. Poderiam ser oito, ou quinze, mas são dez, como os mandamentos da religião mais seguida (ainda é?) no Brasil. Eis, então, que isso já sacraliza o discurso, o que se confirma, ainda, com o fato de serem falas maternas, e não parentais. Ou seja, reforça-se o estereótipo da mãe como figura sagrada, indelével e perfeita. E isso, minha gente, esmaga o feminino, achatando-o numa categoria plana (mães são todas iguais), estanque (ai daquela que ousar sair do padrão!) e machista. Mãe, dez mandamentos e falas sacralizadas. A coisa está ficando feia, e você aí ainda rindo no Facebook.
Mas como eu disse, os cartazes não são apenas curiosos, também são tristes e chocantes. Tristes porque a esteticização da disciplina autoritária serve para reforçar o modelo, e para fazer deles leves e aceitáveis, do tipo que se pendurados na parede da sala não fariam feio com as visitas. E como modelos, referenciam e, pior, não questionam a ordem vigente. São, portanto, retrógrados. E são ainda chocantes, pois denunciam que tanta gente foi criada nessa disciplina opressora, arrogante, sacralizante e agressiva (engole o choro???) e, de quebra, acabaram por me mostrar como tanta gente inteligente do meu Facebook postou sem questionar a mensagem por trás da brincadeira.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Estou avaliando

O impacto da neve, o impacto dos caninos, a solidão, o exílio.
Avalio as condições de criação, as escolhas que fiz até agora, as escolhas que (penso) pautarão o futuro. Estou buscando o aval. O meu, que fique bem claro. Vasculhando a mente para verificar se vale a pena: postar, escrever, registrar, me expor.
Existe outra pessoa depois desses vinte meses. Estou avaliando se consigo conhecê-la.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Diálogos possíveis

- Senhora?
- Sim, pois não?
- Sua bolsa está buzinando.
- O quê?
- Sua bol-sa es-tá bu-zi-nan-do.
- Minha bolsa está buzinando?
- É o que estou falando.
- Hum... acho que deve haver algum engano.
- Senhora, quem parece ter problemas de audição aqui não sou eu, visto que precisei repetir três vezes, ou quatro, se considerarmos esta também, que a sua bolsa está buzinando.
- Meu senhor, estou com meu celular na mão, portanto é impossível que minha bolsa esteja apitando.
- Buzinando.
- Buzinando, apitando, que seja. É impossível.
- Minha senhora, minha senhora...
- Olha aqui, senhor: meu celular, na minha mão, mudo. Aqui dentro da bolsa, olha só, tem carteira, chaveiro, cobertor para o menino, potinho com frutas, fralda, lencinho umedecido, luvas extras, um pé de meia descasado, um palito de fósfoto queimado... como isso veio parar aqui?... uma cenoura ressecada, meu Deus!... uma colher de sopa e... ops!... um chaveiro com buzina.
Bibiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii

*A categoria semificção reúne em uma só narrativa histórias que aconteceram, mas não no mesmo dia.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

O que você está fazendo?

Estávamos todos na sala, conversando. Sim, porque agora falamos os três. Alguns mais ladinos, é verdade, mas ainda assim falamos.
Marido e eu proseávamos e discutíamos os rumos e planos da semana. Arthur, no cantinho atrás do sofá, balbuciava suas conversas ininteligíveis, provavelmente opinando também sobre o que viria a fazer.
Conversa vai, conversa vem, o e-mail do marido apitou, sinalizando nova mensagem recebida. Trabalhando demais, ele foi rapidamente até o computador para ver do que se tratava, se era importante, se era bobagem. Eu continuei tagarelando. Arthur, porém, ficou quietinho.
Blá-blá-blá... vou passar no supermercado. Tititi... precisamos telefonar para o Fernando. Patati... quero visitar a Helen. E marido lá, no computador. Desconfiei que ele não estivesse mais lendo e-mail de trabalho porcaria nenhuma, mas sim que tivesse passado à máquina do tempo conhecida como Facebook, uma ferramenta incrível de transporte para o futuro em questão de segundos.
Virei-me para ele e perguntei:
- O que você está fazendo?
Ao que Arthur, de trás do sofá, responde:
- Cocô.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A rotina e Nietzsche

Eu invejo quem tem rotina certinha. Aliás, na mesma medida em que invejo a tal pessoa, dela desconfio, pois como, COMO?, é possível cumprir ritualisticamente funções e atividades todos os dias? São tantas as variáveis, em todos os níveis de tarefas, que, sinceramente, acho um milagre comermos três refeições e dois lanches diariamente.
Tudo começa na madrugada. Se Arthur dorme bem, geralmente acorda de bom humor. Pode ser que acorde bem-humorado e com a pá virada, pode ser que acorde bem-humorado e calmo, dócil e meigo. Quem sabe? Se ele dorme mal, porém, costuma acordar cansado, o que pode levar a um humor meio estranho. Ou não. Cansado, pode ou não ficar mais calmo, ou mais agitado, ou mais levado, ou irritadiço. Mas a variável da madrugada não termina aí, porque eu também entro na jogada, e o meu sono, se foi bom, ruim, suficiente (não existe muito na maternidade) ou pouco, tudo isso vai influenciar na rotina do dia seguinte, já que serei eu fazendo coisas com e para Arthur.
Complexo? Assustador? Mas nós ainda nem começamos a fazer nada. Estamos nos preâmbulos, no prólogo da história cotidiana, que, se você quer mesmo saber, não deveria se chamar rotina, mas sim caostina.
O caos se instaura quando abro os olhos. Invariavelmente, Arthur já está saindo da cama, o que me faz correr porta do quarto afora, a fim de evitar artes e peraltices. E o caos continua ao longo do dia. Cada microtarefa tem a potencialidade da tragédia. Um lápis na mão e uma folha de papel em branco sobre a mesa? Tanto pode gerar um lindo desenho de rabiscos quanto: uma mão cortada pelo papel; lápis no olho da criança; lápis no olho da mãe da criança; lápis na orelha, perfurando o tímpano; lápis na parede; papel no chão, transformando-se, segundos mais tarde, numa superfície deslizante; entre outras zilhões de possibilidades.
Realizar as tarefas enquanto cuido do pequeno é jogar com o imprevisível, que pode vir com uma surpresa incrível nas mãos, tipo uma nova palavra aprendida pelo pequeno ou um pratão comido no almoço, como também pode acenar com o caos absolutamente enlouquecedor de um pequeno ser correndo pelado pela casa enquanto eu tento, sem qualquer êxito, enfiar, pelo menos, a fraldinha naquela bundinha livre, leve e solta. Poças de xixi, carinho no bichinho de pelúcia, uma subida perigosa numa cadeira arrastada para perto do fogão, uma tentativa de entrar sozinho (de cabeça) na banheira, uma leitura pacata e compenetrada no livro favorito, a espera paciente pelo fim do processo de cortar uma cebola, batidas com um objeto pesado no vidro da janela; a cabeça de um bebê é território inescrutável.
Com isso, meus dias de caostina são nietzschenianos: o eterno retorno, a vida que se repete tim-tim por tim-tim, a vida que traz, na potencialidade de se desdobrar de infinitas maneiras, a eternidade na duração de um dia.
Sendo assim, porque todas as rotinas maternas são, essencialmente iguais, é que eu desconfio de quem diz que traz tudo sob controle.
Maternar é viver no limite do incontrolável.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

O vizinho e o bife

Era uma vez uma mãe que acabara de se mudar para um país que falava outra língua que não a sua. Ela sabia relativamente bem os usos e desusos da gramática e do vocabulário, mas, como todo falante de segunda língua que acaba de aportar na nova terra, ainda precisava lapidar certos meios e modos no novo idioma.
Um dia, essa mãe estava com seu filho na cozinha, almoçando, quando um barulho ritmado e forte começa no pavimento de cima: POU, POU, POU. O filho, com seu dedinho gorducho e carinha de curioso emite um "hã". Aquele "hã" típico, que a mãe já conhece e sabe que signfica: que porra é essa, senhora minha progenitora?
A mãe, prestando bastante atenção, conclui que, àquela hora e naquele lugar, o barulho só poderia significar duas coisas: sexo selvagem enlouquecido ou uma pessoa batendo o bife para o almoço.
Diante das possibilidades, a mãe resolve escolher a resposta mais provável e, também, a mais simples e menos vexatória.
- Filhinho, esse barulho POU POU POU é o vizinho de cima batendo bife.
O filhinho, com seu dedo gorducho, carinha de curioso e olhinhos espertos logo assimila a informação, e para mostrar que entendeu direitinho, dá um tapão no próprio braço.
A mãe não entende de onde aquilo saiu, mas compreende que o filhinho do dedo gorducho captou o sentido de suas palavras. Ela, então, riu, e eles seguiram o almoço entre garfadas, batidas no braço e a frase "é o vizinho batendo bife".
Alguns dias mais tarde, o vizinho, que não é nenhum pé de anjo, caminha para lá e para cá em seu apartamento. A mãe e o filhinho de carinha de curioso escutam. O menino, então, aponta para cima e dá um tapa no próprio braço. Mensagem enviada, mensagem captada. Eles seguem comentando sobre o vizinho que batia bife, muito embora naquele momento apenas caminhasse (e ao que constasse, sem bater bife durante o processo).
Mais tempo se passa e, certa noite, durante o jantar, no dia da final do campeonato de futebol americano, esporte adorado no país estrangeiro em que moram mãe e filhinho de olhinhos espertos, o vizinho resolve dar uma festa. É um tal de passa pisando duro para cá, range o piso da cozinha para lá, bate portas, armários e pratos, grita e muxoxeia a cada lance da partida. E os dois seguem todo o tempo da refeição comentando (e o menino batendo no próprio braço) sobre o vizinho que batia bife, ainda que naquele momento ele apenas comesse snacks, bebesse cerveja e assistisse à televisão.
Eis, então, que um belo dia, no corredor do prédio, acontece o encontro. Mãe e filhinho dão de cara com o vizinho que bate bife, o qual, naquele momento, todavia, não batesse nada, apenas entrasse em casa, como eles.
A mãe arranha um cumprimento no idioma adquirido, o vizinho responde e o filho pergunta:
- Hã?
A mãe, educada, responde:
- Este é o vizinho, filhinho. Our neighbor, sweetheart.
E o filhinho, esperta e previsivelmente, embora a mãe não tivesse atinado para isso naquele momento, começa, feliz da vida, a bater com força no próprio bracinho.

Moral da história: sempre tenha na manga a desculpa de que "arm" (braço) e "neighbor" (vizinho), em português, são palavras muito, muito, muito parecidas em português. Ou apenas ensine que seu vizinho está fazendo sexo selvagem alucicrazy na cozinha durante o horário de almoço. Mas sem gestos, pelo amor!

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Batuque na cozinha sinhá não qué

Eu odeio cozinhar. Tipo, odeio muito. Tipo eu lavo o banheiro, mas não frito um bife. Tipo eu desço e patino no gelo do corredor do prédio com quinze mil quilos no lombo, mas não faço um feijão. Tipo eu sofro, diariamente, pensando nos momentos em que fatalmente irei para a cozinha cozinhar. Sofro. Quase choro.
No entanto, sem falsa modéstia, preciso dizer que tenho talento. Minha memória gustativa e olfativa me permitem calcular de olho os ingredientes e temperos de muita coisa, eu faço combinações inusitadas que dão certo, e raramente erro o ponto das coisas. Sei lá, sexto sentido, coisa cultural ou um ato desesperado do meu inconsciente para se livrar do terror terrificante de esquentar o umbigo no fogão. Não sou uma chef nata, com pratos divinos de lamber a tigela, não. Mas para quem tem tamanha ogeriza ao fogão, eu cozinho bem. Então que esse meu talento só costumava se revelar às pessoas em raríssimas ocasiões, e em casa, no Brasil, eu tinha uma santa faxineira que cozinhava quilos de arroz, feijão, quiabo, espinafre, batata, vagem, milho, cenoura e o que mais minha imaginação (ou a feira livre) permitisse que eu criasse. Pratos simples, pratos especiais, até cuscuz de milho eu tinha prontinho na geladeira mais próxima (no caso, a minha mesmo). Era divino. Era o paraíso na terra. E eu tinha plena ciência disso. Aproveitava cada garfada cozinhada por outrem. Cada pedacinho que não tinha o meu dedo de cozinheira.
Aí nasceu Arthur.
E eu virei a provedora-master de alimentos: sete meses de amamentação exclusiva, depois as papinhas (as primeiras, antes de começar com o BLW), e então a escolha pelos alimentos que meu pequeno consumiria. Não cozinhava muito nesse último estágio, é verdade, mas orientava os rumos da comida na casa.
Aí nós nos mudamos.
Aí acabou a mordomia de faxineira.
Mas eu me mudei para o paraíso das comidas prontas, congeladas, semi-prontas, rápidas, gordas, devagares e orgânicas. Tem de tudo, para todos os bolsos e taxas de colesterol!
Sabe qual a ironia dessa história? Arthur, meu filho, este que saiu do meu ventre, simplesmente recusa-se a comer qualquer comida que não seja a minha.
Um beijo que eu vou ali fazer um arroz.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Os dentinhos e o colar de âmbar

Aos quase vinte meses Arthur tem quase catorze dentes. Digo quase porque os caninos superiores apenas apontaram, rasgando a gengiva, mas ainda não nasceram por completo. Então, ele tem, digamos, doze dentes e meio (1/4 de cada canino).
Os primeiros dentes que vieram, conforme os manuais indicam, foram os incisivos centrais inferiores. Dois de uma vez. Como meu pequeno já vinha usando colar de âmbar, não notei grandes mudanças, sobretudo porque Arthur nunca babou. Pelo menos não daquele jeito que babam muitos bebês, de molhar babador, camiseta e calça.
Esperei os primeiros dentes apontarem para, oficialmente, iniciar a introdução de outros alimentos que não o leite materno. A minha escolha foi pessoal e nada científica, apenas baseada na crença de que a natureza daria os primeiros sinais de que Arthur estaria pronto para ingerir novas texturas e sabores. Esperei, portanto, que ele se sentasse com firmeza e que tivesse dentinhos.
Durante o período, para ajudar a aliviar e também porque era muito divertido, ofereci ao meu molecote cenoura geladinha (devidamente descascada e limpa, sob supervisão para que, caso um pedacinho se soltasse, ele não engasgasse) e picolé de leite materno. A cenoura foi uma curtição, principalmente porque os dentinhos vieram bem no carnaval e fantasiei Arthur de coelhinho, com a cenoura-mordedor fazendo parte dos adereços de mão! E o picolé de leite materno era moleza de fazer: congelava meu leite em uma forminha de picolé (vende em supermercados e lojas de utilidades para o lar, bem baratinho),  o menino pronto para se melecar e deixava que ele mesmo guiasse o geladinho para onde quisesse.
(Sobre o picolé, existe uma ressalva importante: como Arthur nunca apresentou qualquer problema crônico nas vias superiores, como eu morava no Hell de Janeiro e seus 70 graus na sombra, oferecia o picolezinho com parcimônia e ciente de que não era a coisa mais recomendada do mundo, embora aliviasse calor e dentinhos e, de lambuja, ainda proporcionasse uma visível diversão ao meu filho. Escolhas que fazemos nessa vida.)
Depois dos incisivos inferiores, vieram os superiores, e então aquelas gengivinhas rosadas e nuas começaram a ficar povoadas de dentinhos branquinhos e graciosos... que me mordiam os mamilos!
Fiquei desesperada, confesso, com o fato de que depois de sofrer quase todas as urucubacas da amamentação então precisasse encarar um bebê mordedor. Mas fazer o quê? Amamentar era preciso, ficar sem dor não era preciso, segui, portanto, em frente. Quando ele mordia, eu enfiava meu dedinho mindinho na gengiva dele, por trás dos novos dentinhos, e impedia, explicando que machucava a mamãe, um estrago maior. Claro que não funcionava muito. E claro que ele continuou testando no lugar mais seguro do mundo (para ele) a função dos novos apetrechos de seu corpinho. Se seu bebê está fazendo isso contigo, infelizmente, só tenho a dizer: paciência, paciência, amor e muito cuidado para que ele não fira seu mamilo e abra, assim, a porta para infecções.
Pois a vida continuou e veio a nossa loucura da mudança.
Arthur continuava com seu colar de âmbar, e os dentes foram chegando de maneira relativamente suave. Nunca febre, diarreia ou irritação extrema. Um ou outro dia de mordeção (mordedores, dedos e, claro, meus peitos!). Até que um dia eu dei um morango para o pequeno. Não comentei aqui, mas desde que Arthur saiu da creche que eu adotei como método de alimentação o baby led weaning (um pouco sobre aqui e aqui), mais prático. Pois que ele estava atracado ao morango, comigo supervisionando, e de repente o morango acabou: foi devorado com uma rapidez nunca antes vista! Achei curioso, mas nem pensei muito mais sobre o assunto (provavelmente porque, na sequência do morango, Arthur deve ter ido aprontar altas confusões e aventuras). Alguns dias mais tarde, em meio a uma gargalhada, gelei. Ali dentro daquela boquinha lindinha havia manchas brancas. Como tive uma monília carente até mais ou menos uns três meses atrás, fiquei apavorada achando que o fungo tinha passado para meu bebê, e que as manchinhas brancas (características da patologia) eram colônias de cândida na boquinha do meu cândido! Surtei. Um pouco. E por pouco. Fazendo Arthur gargalhar mais uma vez, descobri, completamente perplexa, que os quatro molares haviam nascido ao mesmo tempo (a julgar pelo tamanho uniforme) e eu nem sequer notara! E, não, eu não notara porque estava atarantada demais com as coisas da mudança, mas sim porque ele superou o nascimento quádruplo sem qualquer tipo de reclamação!
Agora, com os caninos apontando, ele tem ficado mais irritadiço e angustiado, levando brinquedinhos e os dedinhos à boca com mais frequência, mas ainda assim tem levado numa boa.
Embora não haja qualquer comprovaçã científica de que o colar de âmbar seja realmente eficaz, por aqui a fase crítica do nascimentos dos dentinhos foi superada com relativa tranquilidade e sem maiores traumas. O risco de estrangulamento e de aspiração das contas de âmbar existe, e todos que optarem por usar tal acessório em seu(s) filho(s) devem estar cientes disso (uma pesquisa rápida no Google oferecerá diversos resultados e advertências). Por aqui, no entanto, essa foi a opção que mais se adequou às minhas crenças e ao meu estilo de vida, e pretendo manter meu pequeno usando-o sob supervisão por mais um bom tempo, já que suas propriedades antiinflamatórias não servem somente para a dentição.
E só para fins de curiosidade, já que nunca experimentei, existe ainda uma outra alternativa natural para aliviar os sintomas do nascimentos dos dentinhos: trata-se da raiz de íris.
Alguém conhece mais algum método não-farmacológico (ou seja, nada de remédios!) de alívio para o período de nascimento de dentinhos?

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Ode ao café

Arábico das mil e uma noites insones
Foste renegado por mim por anos
Mas agora trinca meus dentes
Num sorriso preciso porque vivo

Vivo com sono
Caindo pelos cantos
Cantos de ninar, cantos de embalar
Cantos de acocorar e brincar

Vivo, o grão amargo mais doce que existe
Ressoa dentro de mim
Num bailado artificialmente natural
Cheio de energia e um pouco de polca

Não polco, pois brasileira sou
Mas cafeíno-me,
Pois mãe e trabalhadora,
Estou sempre cansada.
- Ufa, que bom, né? Sexta-feira...
- É. O que vamos fazer amanhã?
- Ué, o que fazemos todos os dias!
- Tentar dominar o mundo?
- Não. Tentar dormir mais cinco minutinhos de manhã.