quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

De repente trinta!

Era ali que morava o bebê, na fralda, na linguagem restrita, no sono diurno. O silêncio só vigiado. A brincadeira só acompanhada. Não comia, não se vestia, não corria.
De repente, agora, tenho um senhor de trinta meses.
Ele fala duas línguas. Uma muito bem e outra galopantemente se consolidando. Brinca sozinho, se veste sozinho, come. Come muito. Come coisas verdes, vermelhas, amarelas, azuis, marrons, brancas e roxas. Fica em silêncio, vivendo a infância, mas não mais desafiando os poderes que um corpo movente lhe dá: já sabe correr sem tropeçar, já sabe que dá choque, machuca ou assusta. E não faz. Ainda apronta, claro, é pequeno, é criança, tem muito o que testar. Fico de olho, com alguma liberdade, porém. Desfralda aos poucos, meu menino. Não dorme mais de dia. Não mama mais de dia. À noite, vulnerável pelo sono, entregue às quimeras, em meio ao escuro, ao intenso, ao visceral, ao cru, dorme e volta a ser um bebê: fraldas, fala, seio. Mas aí desperta com a força de mil cavalos, a energia de mil cafés, a alegria de mil de mim e já não tem mais sua indefesa semiconsciência. É sábio: sabe tudo o que precisa para se vestir, correr, pular, falar, comer, agir e reagir. Faz tantas coisas impressionantes, frases tão elaboradas, que me espanta. Tem trinta meses. De repente. Espera mais um pouco, meu menino, ainda falta um tempo para nos separarmos devidamente. Quanto mais ele cresce, mais espaço abre no mundo e no tempo, e quanto mais espaço, mais saudade cabe aqui dentro.

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