sexta-feira, 3 de junho de 2016

Vamos falar sobre amamentação?

Eu estava grávida, sentada no banco de carona de um carro, quando a irmã de um amigo meu, irmã que eu mal conhecia, que tinha visto de relance umas duas vezes na vida, veio correndo do outro lado do estacionamento e gritou, segurando o cachorro pela coleira:
- Olha, amamentar dói! Mas ó: não desiste, não.
Outro dia, Arthur recém-desmamado, encontrei com ela. Comentei o quanto aquela frase foi importante para mim, agradeci e segui caminho.
Realmente, amamentar pode doer no começo. Para mim, doeu muito. Doeu até Arthur ter mais de 1 ano. Doeu constantemente. Doeu de eu precisar ir ao IFF, me consultar com uma fono especializada em amamentação, de eu tomar analgésico de 8 em 8 horas. Eu, que pari sem anestesia, amamentei na base da sedação, porque eu chorava de dor.
Tem gente que não sente nada? Amiga, se tem gente que vota no Bolsonaro, por que raios não teria gente que amamenta sem dor? Tem gente que gosta de coentro. Tem gente que dá à luz sem nem sentir contração. Tem gente que não gosta de chocolate. Claro que tem gente que amamenta sem sentir nada, que dorme junto do recém-nascido enquanto ele mama, que acerta de primeira todo o processo e pronto. O mundo tá cheio de gente de todo o tipo.
Eu costumo falar isso para as grávidas que me perguntam da amamentação: que amamentar pode doer, que é melhor se informar, se preparar, que eu vou torcer para ela não sentir nada, nada, mas que se sentir, toma aqui o telefone do IFF, também pode procurar outro hospital com banco de leite, anota aí o site e o telefone da fono que me salvou, não esquece de ler este relato e o livro que vou indicar. Boa sorte, vai lá, tudo de bom, boa hora!
Nas reuniões que participei do grupo Amigas do Peito, falava-se em apojadura (descida do leite), pega correta, adaptação do terceiro mês e vida que segue depois que tudo entra nos eixos. As consultoras da La Leche League comentaram comigo sobre monília (cândida/fungo no seio) e ordenha para estocar leite quando voltando ao trabalho. O IFF me ensinou ordenha manual, pega, como lidar com um cisto doloridíssimo que tenho, como observar ganho de peso e se está havendo a ingestão correta de leite. O pediatra do meu filho me instruiu sobre a dieta que eu deveria fazer para ele parar de vomitar em jatos. E foi assim que, depois de tantas consultas e profissionais envolvidos, eu achei que aos seis meses eu estaria expert em amamentação, fazendo tudo com os pés nas costas e que, ai, mal posso esperar para amamentar enternecida de amor e achando aquilo a coisa mais divina e maravilhosa do universo inteirinho!
Acontece que havia dois erros neste raciocínio. O primeiro é totalmente imprevisível. Eu poderia ser das pessoas que não gostam de chocolate e não sentem dor para amamentar, mas sou das chocólatras e fui das que sofri MUITO para amamentar. Dores, dores, dores e mais dores. De todos os tipos, intensidades e origens. O segundo erro é sobre o que eu realmente quero falar neste post.
As pessoas costumam achar que amamentação pressupõe um desenvolvimento linear e progressivo da técnica e do prazer ligado ao ato. A grosso modo, talvez seja assim, sim. E, novamente, quem sabe para aquela sua prima do interior que não curte sorvete isso tenha sido exatamente desse jeito.
Mas o que vejo acontecer com muita frequência são mães que estão amamentando prolongadamente (acima dos seis meses) e que começam a desejar ardentemente o desmame. Ninguém fala para a gente que amamentar também enche o ovário! Que amamentar um ser que tem dentes pode ser um desafio (como ensinar para um bebê de sete meses que aquele barulho engraçadíssimo que ele provoca é, na verdade, o grito esganiçado da mãe que acabou de perder um pedaço do mamilo?). Amamentar pode ser tedioso, pode ser penoso, pode ser desgastante e até mesmo angustiante. O ato de amamentar não é um gráfico em linha reta que, conforme vão passando os meses vão aumentando o prazer e a alegria de amamentar. Não! Amamentar pode exigir que você volte ao banco de leite ou que ligue para a consultora de lactação aos nove meses do pimpolho, porque nem você, nem ele sabem o que fazer com tanto dente naquela boquinha. Amamentar pode ser tão desconfortável à noite ou quando você gostaria de estar fazendo qualquer outra coisa durante o dia que você quer desmamar agora, 1, 2, 3 e já! Amamentar pode ser desafiador e trazer doencinhas ou incômodos realmente importantes. Pode fazer você desenvolver tendinite, travar coluna, dar dor de cabeça por tensionamento dos músculos das costas e pescoço, pode levar a uma condição clínica de falta de vitaminas ou minerais. Amamentar é difícil para caraleo! E pode estar tudo bem no mês 3 e, de repente, no mês 8 dar uma vontade horrível de desmamar logo. Aí você aguenta mais um pouco porque a OMS recomenda amamentar até pelo menos 2 anos e no mês 10 tudo volta a ser delicioso. Até que entra o mês 14 e você tem vontade de jogar a toalhar de novo. E assim vamos, nessa montanha-russa de sensações, emoções, vontades e habilidades.
Mas ó: não desiste, não! Quando você achar que já chega, basta, respira fundo, pensa se é isso mesmo que você quer ou se só está cansada, frustrada e desestimulada. Se for para desmamar, que seja pelos motivos certos. E esses, você sempre sabe quais são. Caso contrário, pensa que eu sou a irmã do amigo com o cachorro na coleira: não desiste, não!
;)

10 comentários:

  1. Ahh tem coisa mais linda que a amamentação =D
    'dói, mas tem poesia'

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    1. Pensar e buscar infos de qualidade, com pessoas e instituiçÕes sérias.
      bj

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  3. Oi, Ártemis! Como é que nunca entrei no seu blog antes?? Num sei.... Mas aqui estou!
    Aqui to grávida de 10 semanas, continuo amamentando a minha filha de 2 anos e sou do grupo das que não sentiram dor. To falando isso baixinho, porque tenho muito medo de sentir desconforto durante a gravidez. Mas apesar disso, a minha filhota era (ou ainda é, estamos testando) APLV. Então passei quase 2 anos sem nadinha de leite e derivados. Foi dificil isso! Principalmente no inicio!
    A vida é como rapadura, é doce mas não é mole não, colega!
    Rita :)
    https://melancianabarriga.blogspot.com

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    1. Oi, Rita!
      Nossa, a dieta APLV às vezes é bem inconveniente. Na época que Arthur era pequeno e eu trabalhava fora, precisava perguntar até como o arroz do lugar era feito, porque se fosse refogado na manteiga ou na margarina, eu não podia comer.
      Mas ó: Arthur se curou da alergia. São muitos os casos de crianças que se curam entre 2 e 3 anos, então há muitas esperanças para Liana.
      bjs

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  4. Amamentei dois anos e oito meses até o bb dizer que não queria mais.
    Não sei como fiz isso.
    Não sei se voltaria a fazer.
    Mas não me arrependo.
    Era leite demais para não oferecer.
    Não doeu mas criou uma bolha de pus que ele travou junto.
    Passava o próprio leite para sarar.
    Doeu ele gritando uma semana inteirinha logo ao chegar em casa e eu tremendo de cansada, parecia ataque de nervos e doeu ainda mais ouvir o povo todo dizendo que era de fome.
    Acertei em insistir e priduzi bastante.
    Foram quase cinco anos sob produção de prolactina. Até quando parei de amamentar.
    Mas, fiz por ele.
    Perdi os peitos bonitos e ganhei um filho saudável que ainda lembra o que foi mamar no peito.
    Ninguém poderia fazer aquilo por ele. So eu!
    Então eu fiz pois creio que se Deus deu peitos e capacitou meu corpo para oferecer o que há de melhor ao meu bb, para que negar tal privilégio.
    Big Bj!

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    1. Parabéns pela amamentação prolongada!
      ÀS vezes, a gente olha para trás e se pergunta como conseguiu faze umas coisas que hoje parecem tão difíceis ou desafiadoras, né? Mas no dia a dia a gente vai levando, levando...e quando vê já passou por poucas e boas.

      Não consegui achar seu blog no seu perfil. Você tem um? Gostaria de retribuir as visitas.
      ;)

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  5. Ri alto aqui imaginado a cena da mulher gritando do outro lado da rua pra vc segurando o cachorro hahaha
    Nunca amamentei,mais confesso que já tenho um certo medinho dessa experiencia.Já li muitos relatos de mães que quase desistiram de amamentar por conta da dor.Queria eu ser uma sortuda e passar por essa experiência inodora... Mias de uma coisa eu tenho certeza,nem tudo são flores né!E a maternidade tem sim o seu lado B que nem sempre é dito!
    ótimo post!
    bjos
    Luh

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    1. Luh, pode doer de verdade, mas com orientação e informação tudo fica muito mais tranquilo. Fique calma que tudo há de dar certo~!
      bjs

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