sábado, 10 de março de 2018

Porque a vida está fácil...

Marido foi viajar a trabalho. Nem foi para longe, mas foi. Com isso, na quinta, véspera da viagem, ele foi buscar o pequeno na escola (geralmente eu que busco). Chegaram em casa quarenta minutos depois, o que é normal, porque sempre rola aquela brincadeira no parquinho, aquela caminhada devagar, catando pedrinhas e gravetos. Chegaram com uma sacola e Arthur com cara de safado, falando frases tipo: "a gente não comprou nada, tá?" (e "baixinho" para o pai: "não conta pra ela!"). Entrei na brincadeira, olhando de soslaio a sacola plástica na mão do marido. "Ah, não compraram? Tudo bem."
Era a mesma sacola do restaurante japonês, então meu estômago já dava pulinhos de alegria.
Marido, então, pede: "Ártemis, olha a mochila do Arthur."
A mochila pesa mais de 2kg, o que é surreal, pois ele saiu de casa só com o tênis lá dentro.
Abro.
Em uma fração de segundos processo tudo que está ali dentro. Não é sushi. Nem sashimi. Um saco. Cheio de pedrinhas. Pedrinhas cor-de-rosa e lilás. Pedrinhas que eu conheço bem.
Porque a vida está bem fácil, comigo trabalhando com três clientes ao mesmo tempo, marido na fase mais difícil do trabalho dele, com viagens, compromissos e palestras, Arthur demandando aquela atenção que um menino esperto de 5 anos demanda, a casa, as coisas da casa, a vida no Brasil e as pessoas no Brasil, porque tudo isso estava fácil demais, marido comprou um peixe!
Agora temos um peixe no quarto do Arthur. Ele nada em um aquário de pedrinhas cor-de-rosa e lilás e em meio a uma planta de plástico cafona nas mesmas cores das pedrinhas. Ele é vermelho e se chama Pinky. A nova cor favorita do Arthur é rosa, acho que já deu para notar, né?
Arthur está encantado.
No dia que o peixe chegou, notamos que a loja esqueceu de colocar a comida no kit do aquário. Por isso, precisamos sair de novo para estrearmos a vida a quatro em grande estilo (ou seja, sem matar o peixe e traumatizar a criança para sempre). Arthur começou a chorar, sentido.
"Mamãe, o peixe vai ficar sozinho? Ele acabou de chegar aqui, não conhece a casa, não sabe quem somos, não sabe que a gente vai cuidar dele. Ele vai achar que está sozinho, abandonado!"
"Meu filho, não vai. Ele sabe que chegou aqui, ele vai ficar bem. Vamos lá antes que a loja feche."
"Não! Ele vai ficar sozinho, tadinho!"
E chorou. E chorou.
Aí chamei filhote para o colo, abracei e sugeri:
"Por que você não vai lá e explica para ele? Assim ele vai saber que a gente vai e a gente volta, vai saber que fomos só buscar comidinha para ele!"
Ele foi. E falou, contou tudo. Quando achei que, enfim, ele sairia comigo, Arthur deu meia-volta e, por sobre o ombro, explicou:
"Ele não vai entender! Eu falei em português com ele!"
E repetiu tudo, tintim por tintim, em inglês.

O peixe está aqui e, brincadeiras à parte, não dá muito trabalho, não. É só dar comida diariamente e trocar a água a cada 1 ou 2 semanas. Quero dizer. Isso e, é claro, todas as noites precisamos dar beijinhos de boa noite no vidro, todas as vezes que vamos sair temos de explicar onde vamos, quando voltamos, quanto tempo ele vai ficar sozinho... Mas pelo menos agora, ao que parece, o peixe já aprendeu o português.