quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Pequeno guia visual de lavagem de roupa

Se ir ao mercado é corrida com obstáculos, lavar roupa é pentatlo: levantamento de pesos, tiros de dez metros para buscar o guri, agachamentos e, porque estamos no inverno, também tem patinação no gelo do corredor dos fundos e, claro, patinação artística, com equilibrio de bebê, trouxas de roupas, chave, sabão e moedinhas.
Ficou curioso(a) para saber como é a aventura?
Apresentamos o primeiro guia visual do blog!

A roupa suja acumulou e você está sem coragem de enfrentar a missão? Este pequeno guia visual vai ajudá-lo(a) a ver com novos olhos essa tarefa inglória das atividades domésticas.

Comece separando o que você precisa para lavar roupa.
Por aqui, precisamos de:

  • Mãe disposta;
  • Bebê disposto, alimentado, trocado e descansado;
  • Roupas sujas;
  • Recipiente para transporte de roupas sujas e limpas;
  • Roupas limpas (ou quase) para vestir - a saber: duas calças adulto, camiseta adulto, suéter adulto, casaco corta-vento adulto, meias e sapatos, luvas e protetores de orelhas + body de manga comprida, macacão flanelado ou de fleece, casaco de inverno com corta-vento, meias, botas, luvas, gorro;
  • Canguru;
  • Chave das áreas comuns do prédio;
  • Sabão para lavar as roupas - aqui usamos um para nossas roupas, outro para as do Arthur;
  • Quinze moedinhas.
Pouparei meus leitores da chatura das camadas e mais camadas de roupas, então vamos logo para a ação.

Chaves, moedinhas e paciência. Muita paciência e disposição.

Prestes a encarar sensação térmica de -27C.

Depois dos levantamentos de pesos iniciais e dos primeiros agachamentos, eis a modalidade patinação no gelo do corredor.

Neve, neve, neve. E mais neve.


Canguru, bebê, trouxa de roupa suja e outra trouxa carregando isso tudo.

Rinque de patinação artística.
Ufa! Chegamos. Agora é hora de mais agachamentos e dos tiros livres atrás do rapaz encasacado.

Moedinhas, moedinhas, moedinhas. Um desafio completo, desde a sua coleção até evitar que filhote as engula.
São quase quatro, mas o processo começou bem mais cedo, logo depois do almoço, afinal todo mundo sabe o quão exaustivo é separar roupas com um bebê ajudando no processo.
Não se esqueça de que todas as etapas feitas até agora são feitas duas vezes, pois temos as roupas nossas e as do Arthur, e eu não tenho a compleixão física suficiente para fazer apenas uma viagem com todas as tralhas + o bebê.
Quase uma hora mais tarde, voltamos para colocar a roupa para secar.
E roupa que seca na máquina num clima seco vocês já sabem o que proporciona, né? Choques de eletricidade estática. Eu gosto de pensar que é TENS, para ajudar nas dores das costas.

Tudo lavado, seco, empacotado, pronto para ser carregado em meio ao gelo e à neve. Muques de aço!
Achei fanfarrão da parte do condomínio colocar esta placa. Singela homenagem à mãe que lava roupa.
Já é noite quando o processo termina. Aí, começam os malabarismos na cozinha.
E aí, pessoal, joinha?







quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Duende

Tem um duende aqui em casa. Ele mora em algum buraco que ainda não descobri onde fica, e no meio da noite sai para passear.
Quando eu morava com os meus pais, também tínhamos um duende, e eu, quando cheguei aqui, preferia o duende tupiniquim, que enquanto eu saía para trabalhar, arrumava a sala, lavava e estendia a roupa, fazia comida, varria a casa, lavava a louça. E eu preferia o duende brasileiro porque o daqui faz justamente o contrário!
E, por culpa desse maroto, embora eu seja agora uma dona de casa, as coisas não andam arrumadíssimas por aqui. 
É que  como agora eu passo muito mais tempo em casa, o tal duende, quando sai, não tem tempo de bagunçar e depois arrumar, como é da natureza desses seres.
Mas querem saber? Bagunceiro ou não, o duende já faz parte da família, e embora me deixe bem cansada, pois há momentos em que não é possível simplesmente deixar para lá a confusão de louça na pia ou a pilha de roupas por lavar, ele trouxe consigo um presente incrível: permitir que eu assista, todos os dias, o dia inteiro, meu filho descobrir o mundo e a si mesmo.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Porque não oferecer água a um bebê amamentado exclusivamente ao seio

Rio de Janeiro, setenta graus na sombra.
Tá, tá, tá. Exagerei. Mas a gente sabe que nessa época do ano, no Brasil, a coisa ferve mesmo em alguns lugares, e tem dias que é difícil viver sem derrapar no próprio suor.
Aí, amiga, você, recém-parida (ou quase), se pergunta, como todas as mães que pariram no trópicos antes de você: dou ou não dou água para o meu filhotinho que só mama no peitinho?
E eu respondo: NÃO!*
Não dê água para o bebê menor de seis meses e que é amamentado exclusivamente ao seio.
Está calor, eu sei. Mas sabe quem também sabe? Suas tetas! É. Suas glândulas mamárias já perceberam que a coisa está quente e que a ingestão de água aumentou, com isso, o seu leite já está mais hidratante, inclusive perfeitamente equilibrado em termos de sais minerais, que entre outras coisas, facilitam a absorção de líquidos. Além disso, outra pessoa também já notou que está calor: o seu bebê, que provavelmente está mamando mais vezes porque, afinal, suar dá sede.
E não importa que venha a tia agourenta do vizinho do avô do marido falar que deu água para o bebê de dois meses. Também não se deixe convencer pela própria mãe, ou sogra, se elas insistirem que "mal não faz". Porém, se a tentação é grande e você derrapou não somente no suor lá em cima, mas também na segurança que tinha sobre a informação, deixo com vocês a resposta da Socorro Moreira, ex-participante da lista Parto Nosso, que frequentei por anos, sobre por que não devemos dar água ao bebê menor de seis meses amamentado somente ao seio:
"Em primeiro lugar, porque para garantir que o bebê vai receber uma água perfeitamente estéril é preciso filtrar, ferver e aerar a água, já que a água depois de fervida fica 'pesada'. Ah, e tem que ser água tratada. E precisa ferver todos os acessórios, como bicos, mamadeiras e copinhos. E precisa convencer a criança a beber aquela água, que não tem gosto de nada. Como se não bastasse toda essa trabalheira, ainda tem o fato de que água é só água. Não tem vitamina, anticorpos, não vem na temperatura do corpo que facilita e muito a absorção.
Se for água mineral, dependendo da quantidade de sais minerais da água, ainda pode-se correr o risco de se sobrecarregar os rins do bebê.

Ok, não convence a pessoa. Porque tem gente que diz: Ah, mas você começou a tomar água com dois meses.
Bom, se a pessoa se propuser a filtrar a água, ferver, aerar, esterilizar a mamadeira ou o copinho que vai dar e ainda por cima oferecer a água para a criança, cara, essa criatura precisa vir aqui em casa. Tô precisando de alguém assim disposto para lavar louça, guardar roupa, olhar os meninos enquanto eu trabalho.
No final das contas, às vezes tudo que a gente precisa é daquele sorriso muuuito carinhoso e a frase: 'Ele não bebe água porque a mãe dele sou eu e eu não permito. Quando chegar o tempo de dar água, eu mesma dou!'"



OBS: Não quero ver ninguém surtando porque não deu água tratada, filtrada E fervida para o filho, ou porque deu água mineral. Este é um texto informativo e que visa a ressaltar a superioridade da praticidade e da qualidade do aleitamento materno frente à hidratação feita somente com água, sem destinação específica. Ou seja: na dúvida, pesquise, se informe e vá debater o seu caso com o profissional da área de saúde que atende o seu caso. A orientação, por exemplo, para o Arthur, que começou a beber água com a introdução alimentar, foi somente água filtrada ou mineral, sem necessidade de ferver.


[Quem tiver dúvidas, pode consultar a muito acessível e bem-feita cartilha da Fiocruz ou o documento da OMS sobre o assunto. Se as dúvidas persistirem, convém procurar um banco de leite humano (no fim da cartilha da Fiocruz existem telefones e endereços em todo o Brasil), um grupo de apoio à amamentação (como a La Leche League, por exemplo) ou uma consultora em amamentação.]


*Mas se o médico que acompanha o seu caso mandou dar água, dê! Não sou médica e estou falando de um modo geral. Se você tem dúvidas sobre o seu caso específico, consulte o pediatra do seu filho ou o profissional de saúde que geralmente o atende.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Receita de frango ao molho de laranja com gengibre

Olá, queridos leitores. Na postagem de hoje vamos fazer um delicioso peito de frango grelhado com molho de laranja e gengibre!
Todos prontos?
Lápis e papel na mão que eu vou começar.

Primeiro, antes de mais nada, você deve ir ao supermercado.
Se conseguir voltar com: todos os ingredientes, o bebê sem escoriações ou choros descontrolados, tempo hábil para fazer o almoço e, sobretudo, uma paciência de Jó, já podemos dar início ao prato.
Esta é um refeição leve, muito gostosa e prática.
Quero dizer, é uma refeição muito leve e gostosa.

Ingredientes:
Peito de frango cortado em finas fatias (para nenhuma parte ficar crua, porque é perigoso consumir frango cru)
Laranja
Açúcar mascavo
Manteiga ou margarina
Shoyo
Amido de milho
Gengibre
Um ralador
Uma panela
Uma frigideira

Modo de fazer:
Chegue do mercado esbaforida e pouse no chão da sala todas as sacolas e o seu bebê. Enquanto ele se entretém espalhando todos os itens pelo chão, vá despindo as muitas camadas de roupas, casacos e acessórios invernais. Reserve.
Cate todos os produtos, não se esquecendo de ir buscar no chão do banheiro a caixa de morangos, e dentro da gaveta de calcinhas a bandeja de frango. Guarde o que for de geladeira, deixe o bebê brincando com o que não necessitar de regrigeração e nem representar perigo imediato, tipo o frasco de água sanitária.
Lave as mãos.
Abra a embalagem de frango e repita pelo menos três vezes "não, amorzinho, não mexe no franguinho. Toma aqui este pacote de fraldas, que isso pode". Reserve.
Corra na sala para ver se o silêncio que impera no seu lar significa que o seu bebê McGyver está fazendo fogo somente com um pacote de fraldas e um chocalho babado. Volte correndo para a cozinha e tempere os peitos de frango somente com sal (pouco) e, se quiser, algumas ervas. Afague o cabelo do bebê que está agarrado nas suas pernas, resmungando. Cuidado para não temperar a criança. A não ser que seja dia do marido dar banho.
Lave as mãos, ligue o fogo e coloque a frigideira para aquecer.
Corra no quarto e descubra o que o bebê está arrastando. Volte se for um brinquedinho, corrija se for o iPad do pai.
Volte. Lave as mãos, corte a laranja ao meio e esprema na mão o suco de uma das metades. Pare, vá verificar se o som de batida foi a cabeça da criança no chão ou a estante da sala sendo derrubada. Grite. Arrependa-se. Volte, lave as mãos, continue a espremer a metade da laranja na panela.
Lave as mãos, pegue o seu filho no colo. Com muito cuidado, para não queimar ninguém, coloque os frangos para grelhar. Lave as mãos, não molhe o bebê, esprema a outra metade da laranja. Coloque um pouco de açúcar mascavo no suco de laranja. Desvie das mãozinhas curiosas e derrame uma porção involuntária e generosa de mais açúcar mascavo. Pense "dane-se!" e continue. Segure o bebê, não deixando que ele caia ao se jogar do seu colo rumo ao pedaço de gengibre. Tudo bem se ele mascar a raiz. Dizem que faz bem para a garganta.
Pegue um biscoito. Entregue o biscoito na mão do bebê, tentando, ao mesmo tempo, recuperar o gengibre. Negocie. Regateie. Chantageie. Arrependa-se.
Pegue o gengibre (de preferência distraindo o bebê com outras coisas), passe no ralador. Não muito. Para uma laranja grande eu usei cerca de uma colher de café.
Vire o frango na frigideira. Cuidado com a perna da criança.
Ligue o fogo sob a panela com o suco de laranja "temperado". Você deve fazer uma redução. Ou esquentar um pouquinho, o que seu bebê permitir que você faça.
Pouse a criança no chão, explicando que agora você vai precisar das duas mãos um pouquinho.
Vete a tentativa de mexer nos botões do fogão. Vete a tentativa de puxar o fio da cafeteira. Repita "não, amorzinho, não mexe no franguinho. Toma aqui este pacote de fraldas, que isso pode". Mais uma vez. Mexa a panela com a redução.
Ignore a receita e passe a misturar os ingredientes conforme você "sente" que funciona.
Corra na sala, não deixe que o bebê pegue o copo de água que você esqueceu em cima da escrivaninha. Console seu choro. Volte para a cozinha, mexa a panela, desligue o frango, chame o bebê e apresente a ele uma maravilhosa escumadeira. Repita "não, amorzinho, não mexe no franguinho. Toma aqui a escumadeira, que isso pode". Guarde (finalmente!) o frango. Pegue o bebê no colo. Coloque a manteiga (uma colher de sopa) e dissolva. Retire a mão do bebê de dentro do pote de manteiga e lave-a copiosamente, para minimizar a gordura. Pouse a criança no chão. Acrescente um pouco de shoyo. No molho, não no bebê. Cuidado, pois o ideal é o equivalente a uma colher e meia de sopa, mas se você for olhar para o lado porque o menino está prestes a prender o dedo na gaveta, você pode derramar mais do que o necessário. Se isso acontecer, console-se pensando que o açúcar mascavo em excesso vai cortar o sal do shoyo em excesso.
Lave as mãos, abra o armário, retire a faca da mão do bebê (era sem serra e sem ponta, ok, mas nunca se sabe). Coloque uma colher de sopa de amido de milho na panela. Assista ao empelotamento do molho enquanto você dá colo ao bebê. Mexa até engrossar. Acalme o bebê, coloque-o na cadeira de refeições. Sirva-o.
Sirva-se de arroz, um peito de frango e regue com o molho, tomando o cuidado para não pescar as bolotas de amido e nem o biscoito ou o pedaço de cenoura (!!) que seu filho conseguiu jogar dentro da panela.

Bom apetite!

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Da chegada - voo

Olha, longe de mim querer traumatizar as pessoas, por isso faço questão de lembrar-vos de que Murphy me ama. Aliás, Murphy deve ter uma paixão enrustida por mim, daquelas que deixam cheia de recalque o apaixonado não-correspondido, que a qualquer pretexto ou oportunidade dá aquela espezinhada safada. Sabem como é? Tipo o Pedrinho, da terceira série, que puxava o seu cabelo no recreio, e que no primeiro ano do ensino médio veio declarar o seu amor no meio do primeiro porre na festinha do Gutão.
Então. É assim comigo.
Murphy me ama, me idolatra e se ressente de eu já ser casada.
Tendo isso em mente e a passagem na mão, vamos embacar comigo nesse voo.
"Atenção, senhores passageiros, com destino a Chicago. Embarque no portão 666. O inferno os aguarda."
Ignorei a voz sensual no microfone e, de passaportes e passagens em riste, fui dar tchau para a família, que foi em peso ao aeroporto. Só faltou a Genoveva, a galinha do sítio da minha tia. Aliás, era só ela mesmo que estava faltando naquele aeroporto ABARROTADO! Das duas uma: ou o Brasil vai muito bem e está todo mundo podre de rico, viajando horrores, queimando dólares para aquecer lareira e euros para acender charutos, ou o país vai mal e todo mundo está fugindo!
Bom, eu não estava nem fugindo, muito menos nadando em dinheiro. Estava apenas tentando embarcar para minha nova vida. Embarcar com marido, filhote e a madrinha do filhote, devidamente convocada para ser um par extra de mãos (a.k.a. mão de obra para trabalhos domésticos e babazísticos. Faz parte. Por isso, sugiro que a madrinha do filho de vocês seja jovem. Se não jovem, disposta e cheia de energia. Se nada disso, pelo menos rica. Optei pela madrinha jovem.). Então estávamos nós e nossas infindáveis malas, malinhas, maletas, sacolinhas e bolsinhas, sling, objetos de uso pessoal, passaportes, apretrechos e casacos, nos despedindo da família inteira. Choro, gente se jogando no chão e gritando "nããããoooo", correria, desespero. Tá, mentira, não teve nada disso, mas a minha mãe chorou.
Entregamos as passagens para a moça da entrada, ela fez "PIP" com aquele leitor a laser, e nos encaminhamos para a área de segurança. Nós e a penca de penduricalhos, aí incluído Arthur, que arrastávamos conosco.
Eu não sei vocês, mas sempre fico tensa em revistas. Mesmo que eu não deva, eu tremo. Acontece que dessa vez eu achava que devia, porque entrei num fight com o pessoal da companhia aérea e estava contrabandeando para os EUA duas perigosíssimas sopas congeladas sem leite ou derivados. É que a bodega da American Airlines não tem dieta especial sem leite e derivados, só uma refeição vegetariana safada (cheia de queijo e abobrinha, provavelmente. Odeio abobrinha), e a solução que me deram para o meu caso foi que eu levasse a minha própria comida. Mas precisava ser industrializada. Lá fui eu na véspera do embarque catar uma comida congelada sem leite ou derivados. E lá fui eu, no dia do embarque, para a área de segurança cheia de medo de me interrogarem por conta das sopas.
Passamos. Nós, as tranqueiras e as sopas.
Eu deveria ter desconfiado de que, se uma coisa funciona maravilhosamente bem na minha vida é porque Murphy está preparando algo mais grandioso em meu futuro. Eu, porém, devia estar ocupada demais correndo atrás do Arthur para notar tal fato. E segui em frente.
O avião foi um caso a parte. Não digo NO avião, mas sim O avião, que devia ser velho, recauchutado e obsoleto, já que teco-tecoou do início ao fim, nos brindando com narizes e gargantas secos, barulhos altos e incômodos, sacolejos e nheque-nheques mil. Se viajar com um bebê já é uma aventura, na classe econômica, num avião caindo aos pedaços e sem jantar pode ser considerado um inferno.
Opa! Pera lá! Sem jantar? Mas e as sopas? Bem, em meio a mil e uma ligações para a companhia aérea, ninguém nunca, jamais, em nenhum momento mencionou que a comida congelada deveria vir numa embalagem que permitisse o descongelamento e aquecimento em forno convencional. E eu, preocupada com mil outras coisas, nem me lembrei de que microondas e instrumentos de navegação aérea não devem combinar, né? Enfim, minhas sopas só poderiam ser descongeladas e aquecidas em microondas, que não tinha no avião, e então eu passei a viagem toda comendo Oreo, que não tem leite.
Ao chegarmos, enfim, em solo americano, a viagem parecia mais ou menos encaminhada para um desfecho tranquilo, pois o voo seguinte seria feito a partir do mesmo aeroporto em que fizemos a imigração e tinha uma folguinha no horário. Depois de cerca de onze horas sem dormir, com pele e mucosas faciais ressecadas pelo ar tenebroso da cabine, as costas massacradas pelas "poltronas" e por carregar Arthur para cima e para baixo, o voo de cerca de duas horas parecia, ao mesmo tempo, a redenção e o que sugaria nossas últimas energias.
Tudo parecia bem, até que os computadores da imigração norte-americana travaram. E nós ficamos por ali, na fila, esperando, uma pá de tempo. E quando saímos, para pegar o segundo voo, já estávamos atrasados. Marido e madrinha não queriam perder tempo, e fizeram cara feia quando eu parei para perguntar a um funcionário do aeroporto para que lado ficava o nosso portão de embarque. O tal funcionário pilotava uma geringonça que parecia a limusine dos carrinhos de golfe motorizados. Um trenzinho "conversível" comprido mesmo, com os símbolos de portadores de necessidades especiais na lateral. O moço, apiedado da nossa situação, falou "entrem!", e nós entramos. Entramos e saímos em grande velocidade, com um vento gelado batendo no nosso rosto, pelo JFK! Foi divertido, Arthur adorou, eu adorei, todo mundo se divertiu. E chegamos ao guichê/portão de embarque bem na hora... de ver, através daquele janelão, o nosso avião levantar voo sem nós!
Emitimos novas passagens e esperamos. Uma hora até o próximo voo. Depois, outra hora dentro do avião, nem me lembro mais do motivo, confesso. Aliás, depois do passeio de trenzinho pelo aeroporto, não me lembro de mais nada. Tudo não passa de um borrão de exaustão, choro, fome, dores musculares e ansiedade. Acho que chegamos bem. Acho que comemos. Acho até que fomos ao supermercado comprar itens de necessidade básica.
Depois me perguntam se eu não quero voltar para o Brasil. Minha gente, se eu pudesse, e se a saudade deixasse, nunca mais que eu entrava num avião, que é para não correr o risco de pegar, mais uma vez, Murphy na cabine de comando.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Mimem seus filhos!

Segundo o dicionário Aulete, existem cinco acepções da palavra "mimo", e somente uma tem cunho pejorativo. Acho curioso que justamente esta acepção, que associa excesso e carinho especificamente ao mundo infantil, tenha ganhado tal força que apague as demais. Como assim vivemos numa sociedade em que ignoramos solenemente "graça, leveza, coisa encantadora, delicada ou bela"?
Bom, aí eu comecei a remoer, né?
Tudo começou... ora, sei lá bem como começou. Acho que desde que Arthur saiu daqui da pança e não ficou no bebê conforto, nem no carrinho, nem no bercinho, as pessoas começaram a ficar incomodadas com as minhas escolhas. Ora, que chatura! Gostaria de saber de onde as pessoas tiraram a ideia estapafúrdia de que carinho faz mal, sobretudo, ao caráter de uma pessoa. 
Pois bem, o fato é que fiquei aqui matutando sobre o que significa mimar uma criança, e sobre por que encher o filhote de carinhos e afagos causa tanto frisson.
Ora, mimar, se tomarmos a significação pejorativa da coisa, entendendo que uma criança mimada é necessariamente algo não desejável, logo inferimos a ideia de oferecer à criança uma resposta incorreta quando ela pede amor. Incorreta porque imprecisa, porque não precisa, desnecessária. 
A criança PRECISA de amor, de cuidado, de afeto, de atenção. Ou seja, ela precisa de mimos, nas outras quatro acepções dadas pelo dicionário. 
Por outro lado, a criança NÃO precisa do último videogame, de ganhar presentes e mais presentes a cada efeméride, de ter zilhões de brinquedos e DVDs e, sobretudo, ela NÃO precisa (e nem deveria) ser largada sozinha com todas essas desnecessárias materialidades. Note bem que eu não estou julgando ninguém, nem pretendo analisar a conduta de nenhuma mãe. Estou pensando genericamente sobre esse rótulo do "mimado", até porque ele foi o meu rótulo durante anos, apenas porque eu sou filha única.
Eu acho que as pessoas dizem que uma criança é mimada porque não entendem que amar é mimar, porque é cuidar, é zelar, é dar afeto, é dar carinho, é agradar/ser agradável. Isso não estraga ninguém. E mais: é coisa completamente diferente de dar materialmente as coisas. Esses "agrados materiais" são, muitas vezes, uma muleta para os pais, que compensam ausências físicas e emocionais, e para os filhos, que se agarram a coisas, quando deveriam se agarrar a pessoas e emoções. Na nossa sociedade, em que ter se confunde com ser, não causa espanto a confusão na mais primordial das relações, não é de se estranhar que mães e pais queiram mostrar à sociedade o quanto amam seus filhos enchendo-os de símbolos e emblemas do ter, do bem-cuidar: carrinhos caros, eletrônicos, coisas de última geração (e aqui se incluem alimentos ditos "de ponta", como leites fortificados ou vitaminas XPTO), tudo "do bom e do melhor". Não acho que façam isso de má fé. Ao contrário, querem mesmo dar tudo de bom e do melhor. Mas a gente está numa sociedade em que as escolhas (e escolher É consumir) estão pasteurizadas, ou pré-definidas. Vemos isso quando os pais são rotulados, tipo, se o nascimento se deu através de cesárea, os pais vão dar leite artificial, chupeta, Galinha Pintadinha e festa no buffet infantil. Em contrapartida, se o nascimento se deu através de um parto domiciliar, os pais serão adeptos de sling, evacuation comunication, amamentar até fazer 18 anos e só dar presente de garrafa PET reciclada. Como se fosse um pacote, feito aqueles de quando a gente casa: dez bem-casados, vinte chocolates, dois tipos de croquete, suco e refri.
Só que não é assim, né? 
As escolhas estáo aí para serem... escolhidas. E muita gente está ocupada demais para fazer isso, ou então ainda não percebeu que pode ser assim. Ou já percebeu, já escolheu algumas coisas, outras não, mas não se livra do rótulo. E o rótulo serve para quê? Para vender! Vender ideias e produtos e estilos de vida a um grupo que possa ser enquadrado num determinado público-alvo. Então, se a criança está "mimada", num estado que parece beirar a patologia, vem uma série de produtos e soluções para ela: Super Nanny, livros, filmes, produtos que vão fazer do momento de interação com o filho algo inesquecível e dinâmico. 
Mas eu vou contar um segredo, aqui, ó, bem baixinho. Só entre nós: as crianças não precisam de rótulos, nem de brinquedos, nem de angústias, nem de exigências de independência e maturidade precoces. Eles precisam de amor, limites claros para que não se machuquem (física e emocionalmente) e para que se insiram socialmente de acordo com os valores da família em que vivem.
Então, por favor, mime o seu filho! Continue amando, siga o seu coração, continue se questionando, mas respire fundo. Você não está sozinha nas escolhas, medos, dúvidas e angústias. Nós todas somos você, a mãe que quer (e deve) oferecer ao filho todo amor do mundo.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Pling, pling, pling

Pling. Pling. Pling.
Eu não sabia de onde vinha o barulho, e tal e qual um cão perdigueiro, saí pela casa caçando-o.
Pling. Pling. Pling.
Ia pensando que o frila estava atrasado de novo. Pensando se eu tinha comprado comida suficiente para os estimados três dias de frio intenso, durante os quais fomos recomendados a ficar em casa, sob o risco de congelar os membros expostos em apenas cinco minutos. Pensando se daria tempo, naquele dia, de pegar o computador de tardinha, quando Arthur dormisse, para frilar um pouco e tentar correr atrás do tempo perdido.
E então eu descobri!
Pling. Pling. Pling.
Uma infiltração. Uma goteira. Muitas gotas, que depois viraram um fio de água que escorria do teto. Bem em cima da mesa. Onde repousava nosso computador.
Perdemos frila, computador, manchamos a mesa e ainda ficamos com um teto estropiado. Tudo isso no meio da onda de frio glacial que varreu os EUA.

Daí, ontem, de novo: Pling. Pling. Pling.
Gelei.
Pelo menos não temos mais computador (na sala) para quebrar.
Pling. Pling. Pling.
Feito um cão perdigueiro, fui caçar de onde vinha o som.
Pling. Pling. Pling.
Vocês não imaginam a alegria que é ter uma pia mal fechada na cozinha!

Da chegada

Olhando de baixo, na segurança sólida do solo sob os nossos pés, nem sempre os desafios parecem ser tão intensos. A perspectiva dá uma coragem muitas vezes enganosa, quase sempre surpreendente.
"Claro que eu vou! Imagina, nem é tão alto, nem é tão difícil, tanta gente já fez isso."
A verdade é que em todas, em absolutamente todas as situações da vida, a gente nunca sabe o que realmente acontecerá até que realmente vivamos o momento. Mesmo uma grávida de milésima viagem, mesmo uma pessoa que já se mudou duzentas vezes, mesmo quem está mais do que escolado em fazer qualquer coisa na vida. A pessoa tem uma ideia do que lhe espera, mas saber, saber de verdade, não sabe.
E aí que eu não sabia. E acho que não soube até que todo o processo estivesse numa nova fase, dando por encerrada a etapa da mudança.
No Brasil, as expectativas foram até realistas, sob certo aspecto, porque repetíamos a cada passo burocrático que dávamos rumo à nova vida "vai ser difícil no começo". No entanto, a gente não fazia ideia de COMO seria difícil. Ou seja, nós sabíamos que teríamos desafios a enfrentar, alguns até já desconfiávamos que encararíamos, mas só quando vivemos o processo foi que conhecemos o rosto dos monstros contra os quais precisaríamos lutar.
Hoje, seis meses depois da mudança, sinto que finalmente vencemos a primeira etapa, a da chegada, a do estabelecimento básico. Agora, no horizonte, novos desafios, novas armadilhas, novas surpresas, alegrias, desventuras, sustos. Mas, por ora, por hoje, enfim chegamos.

domingo, 12 de janeiro de 2014

Despedidas

Tem gente que não gosta de despedidas. Esse, definitivamente, não é o caso do Arthur.
Lembram que ainda pequenininho ele aprendeu a dar tchau e me deixou de queixo caído? Pois aqui, já dominando a fina arte do balançar a mãozinha de um lado para o outro, girando-a em seu próprio eixo, Arthur nos surpreendeu de novo.
Tínhamos mais ou menos um mês de vida estadunidense e fomos a um restaurante. Ou melhor, a um "restaurante". Sabem, aquelas redes de comida nada saudável (embora não sanduíche) e cheias de sal e gordura? Então, era um lugar desses, onde fomos parar por necessidade. Arthur ainda estava na fase "vivo de luz, não preciso dessas coisas mundanas que querem me enfiar goela abaixo" e não aceitou a única opção saudável do cardápio, nem nada do que levamos para ele, nem deu a menor pelota para a nossa comida junk. Estávamos, portando, desavisados. Nada no comportamento dele anunciava qualquer mudança.
Pois bem, comemos, bebemos, pagamos e fomos em direção à porta. Na saída, uma mocinha simpática do lugar dá o "obrigada por comerem aqui" do manual de atendimento ao cliente e emenda: bye! Ao que o meu pequeno responde, em alto e bom som, com a mímica relacionada: bye!
Assim, minha gente. Na lata. Dentro do contexto! Balançando a mãozinha, que é para ninguém achar que foi uma coincidência ou algo que ouvimos errado. BYE!
Eu não estava pronta para isso e passei uns bons minutos embasbacada, repetindo para marido que ele dissera "bye" e, claro, pedindo para ele repetir a gracinha.
Agora, o bye-bye está mais do que estabelecido, e nos acompanha com frequência (nem sempre ele está a fim de fazer). Mas eis que outro dia, mais uma surpresa: Arthur termina a mamada, olha para o seio e, com  a mãozinha estendida e balançante, diz: bye!

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Fogo!

Toda mãe é meio maluca, eu sei, você sabe, todos sabemos. No entanto, se houvesse um concurso das mais malucas, talvez eu ganhasse ao menos uma menção honrosa.
Se dependesse da ex-creche do Arthur, certamente o título de mãe maluca do ano de 2012 seria meu. Mas fora do circuito mainstream (que acha minhas práticas hipsters demais) também não faço feio, porque algumas maluquices são memoráveis.
Hoje mesmo, por exemplo. No meio do processo de colocar Arthur para dormir comecei a divagar: neve, frio, filho, frila... as associações livres sempre dão margem às minhas maluquices aflorarem (Freud, seu maroto!). Meu pensamento estava no frila, e portanto no computador, quando eu vi. Nítida, clara e efêmera: uma luminosidade amarelo-alaranjado. Fugaz. Fogaz? Fogo? Fogo! O computador, que fica ligado na tomada com dois adaptadores, num esquema pronto para o curto circuito incendiário, estava pegando fogo!
Dei um pulo, arranquei um Arthur sonolento do peito, pronta para correr para fora de casa, rumo aos -40ºC que está fazendo lá fora, o grito já se formando na minha boca aberta quando eu vi novamente: a luz amarela piscante do caminhão que limpa a neve da rua.
Votem em mim. Estou precisada de ganhar qualquer coisa que me dê títulos, status e, com isso, quiçá, algum trocado.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Compras

Assim que a porta se fecha eu me arrependo. Vejam bem, é uma necessidade. Se eu tivesse escolha, não ia. Mas se eu não vou, o que acontece? Fome. Choro. Ranger de dentes. Mãe desmaiando. Então, eu preciso ir.
A vontade é de vestir armadura e ir urrando pelo caminho, já que é papo de matar um leão. Um leão por dia. Porque não tenho carro e preciso fazer as compras de supermercado a pé, no meio da neve, com Arthur a tiracolo. Ou melhor, no carrinho. Ou melhor, no carrinho quando ele quer entrar. Ou melhor, no carrinho quando eu consigo colocá-lo lá dentro antes que ele escorregue por baixo da barra de segurança me dando vários choquinhos por causa da estática do casacão friccionando-se contra o tecido do carrinho.
No topo da escada, eu estou com Arthur no colo (ou no chão, tentando se jogar escada abaixo, já que ele ainda não sabe descer direito), o meu casaco, o casaco dele, luvas, cachecol, gorros e a chave de casa. Trancar a porta é luxo. Chegar com o coque ainda preso lá embaixo, também.
A vontade é de voltar correndo, me jogar no sofá e ler um livro a tarde toda. Mas se eu não for ao supermercado, fico com fome. Ou melhor: ficamos. E como agora não sou a única por aqui, visto a armadura (virtual) e desço quatro lances de escada, espeto filhote no carrinho e saio arrastando neve e mais neve por aí.
Invariavelmente chego no supermercado (que fica a uns quatro quarteirões daqui de casa) suada onde coberta, gelada onde exposta e meio rouca, de tanto ficar matraqueando no frio para distrair Arthur.
Lá dentro, táticas de guerrilha, pois o leão espreita: carne ou frango, arroz, feijão, frutas, verduras e legumes, suco, outro item de necessidade imediata. Não posso comprar muito porque não tenho como carregar tudo de uma só vez: se estou de carrinho de bebê não posso pegar o carrinho de compras; mas se vou sem carrinho de bebê, não posso comprar muitas coisas já que não dou conta de carregar compras + bebê + roupas minhas e do bebê. Também o carrinho é meio fuleira e anda mais para lá do que para cá. Não convém sobrecarregar.
Pago. Ensaco. Arrumo no carrinho, na mochila, e volto.
O leão ainda espreita: às vezes preciso comprar uma barrinha de cereal porque a saída é tão complexa que acabo morrendo de fome no supermercado mesmo, e para não desmaiar, vou comendo pelo caminho. Comendo e arrastando carrinho, bebê, compras, roupas e neve. Muita neve. Neve a dar com pau. Neve de se atolar, de se perder, de fazer pocinha de água suja iguaizinhas às do Rio. Neve branca, neve preta, neve cinza, até neve amarela de xixi de cachorro. Neve. Neve socada e firme. Neve fofa e soltinha. Neve que cai do céu, que voa do chão e dos telhados, neve que vem até na horizontal, sabe-se lá de onde, porque aqui nessa terra batem uns ventos muito loucos!
Coberta de neve, chego à portaria.
Não tem porteiro, então preciso abrir e fechar a mão diversas vezes, para que o sangue volte a fluir e eu consiga mover os dedos e pegar a chave. Calço sempre duas luvas, mas não bastam. Já comprei luvas de todos os tipos e formatos e elas ainda assim deixam minha mão gelada. Paciência. Vai ver um duende enfia neve dentro da luva. Vai ver sou sensível. Vai ver eu me acostumo.
Entrar na portaria às vezes é fácil, mas geralmente complica porque a porta é pesada e preciso encontrar o sutil equilíbrio entre erguer as rodas dianteiras do carrinho enquanto o puxo, e com a perna, chutar a porta (que delicadeza!) para que ela se abra. Agora tenho músculos firmes nas pernas. Mas o equilíbrio é o segredo, para que o carrinho não tombe para trás, nem eu caia de bunda ou de cara. Já virei o carrinho uma vez. Arthur, felizmente, estava do lado de fora, com o pai. Porém, geralmente estou sozinha, com Arthur dentro do carrinho, então é importante manter o equilíbrio.
Aliás, é sempre muito importante manter o equilíbrio. Dentro de casa, fora dela, ou entrando nela.
Entrar na portaria é fácil. Duro é abrir a segunda porta e estacionar o carrinho e retirar as sacolas e o pequeno e subir com tudo: compras, bebê, roupas. O carrinho fiz um acordo e fica mesmo na portaria, amém!
Geralmente respiro fundo (que é para não endoidecer logo de manhã) e faço tiros de lances, nova modalidade olímpica para 2016. Sabem como é? Você coloca o bebê no chão, pede para ele ficar quietinho e esperar, sobe correndo, pulando de 2 em 2 degraus o primeiro lance de escada com as compras todas nas mãos. Pousa as sacolas, desce correndo para evitar que o bebê suba as escadas sozinho, agarra o filhote, sobre com ele, pousando-o ao lado das compras. Daí, você fala para ele esperar um pouquinho, quietinho, passa a mão nas sacolas mais uma vez, sobe correndo, pousa as compras, volta, pega o moleque, pousa o moleque...
São quatro lances de escada. Tô craque!
Às vezes estou ousada: subo com tudo dando um foda-se à minha resistência patética. Quatro lances de escada com bebê, roupas, compras e chave na mão. Se tiver correspondência, também levo. Chego suada, esbaforida, achando que vou morrer. Mas não tem a adrenalina de ficar olhando Arthur para que, ao menor movimento em direção à escada, eu dê um triplo twist mortal para trás e segure o menino, mesmo às custas de ovos se quebrando ou compras se esparramando escadaria abaixo (sim, já aconteceu comigo. As duas coisas).
Há também os dias em que estou paciente, ou cansada, ou temerosa (a gente conhece os filhos, e quando eles acordam na vibe de fazer besteira, melhor não arriscar). Nesses dias eu costumo soltar Arthur na escada e subir escorando ele, carregando tudo, e chegando em casa cerca de meia hora depois de ter entrado na portaria.
Já tentei também deixar filhote no carrinho, subir correndo com todas as compras e voltar num pulo para buscá-lo. Mas não curti. Foi rápido, é seguro, mas tenho medo de alguém entrar (a louca, já que só quem tem chave entra) e levar meu filho, de ele chorar ou se sentir abandonado.
Já tentei dividir as compras em partes e ir subindo com elas e com Arthur no colo. Mas quase morri e achei que enquanto eu não treinar para triatlo, não vale o risco de infarte.
Também já arrisquei subir, pegar sling, colocar Arthur lá dentro e subir com as compras e com ele no sling. funcionou em termos, pois filhote ficou meio frustrado quando voltamos para casa e não demos uma nova voltinha.
Enfim, cada dia é uma técnica nova, mas sempre que chego à porta de casa rola o estresse da abertura da porta. Mesmo se não deu tempo de trancar, eu vou precisar empurrar a porta (pesada), enfiar compras e Arthur dentro de casa ao mesmo tempo em que descalço nossas botas cheias de neve e as deixo na entrada de casa. Costumo ter de interromper a missão umas duas ou três vezes para evitar que Arthur se atire lá embaixo ou que jogue nossas compras pelo corredor do prédio. Também evito subidas para o andar de cima e abertura de embalagens, sobretudo das caixas de ovos, que são incrivelmente tentadoras. Tão tentadoras que guardei uma para virar caminhão para ele brincar!
Enfim, eu sei que deveria, como a Aline sugeriu, tirar uma foto ilustrativa do caos. Mas pergunto: onde vou enfiar uma câmera no meio dessa situação?
É favor não responder.
Obrigada.