quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Fernando Sabino reeditado

Estava eu em casa, de pijama, em mais um dia modorrento de pré-inverno chuvoso na Bélgica. Estamos com chuva há 5 dias e teremos tempo nublado/chuvoso até dia 23, pelo menos. Então, no panorama geral, Trump tinha sido eleito presidente do país onde devo morar até 2018, Temer deu um golpe no país onde nasci e no país onde atualmente passo uma temporada estava chovendo gordas lágrimas de decepção liberal. Nesse contexto, pijama em casa era o máximo que eu conseguia administrar.
Tudo corria bem, apesar do clima 7X1-e-os-fascistas-tão-chegando, até que Arthur grita e dá um pulo:
- Uma aranha!
Onde? Não tô vendo. Ali, correu. Vi. Era uma pernalta amarronzada e estava bem na frente do meu filho. Meu filho que não admite que matemos nenhum bicho que não seja mosquito que morde. Meu filho, também de pijama, que acompanhava o caminhar elegante da aranha pelo chão da nossa sala.
Qual saída? Distrair o menino e pá!, matar a aranha? Não, o mundo não precisa de mais gente escrota, mentirosa e hipócrita. Então, fui tocando a aranha feito gado pela sala, no intuito de expulsá-la para fora de casa, pela porta da frente, em grande estilo e sem estragos. Passamos pela mesa, conduzi o aracnídeo até o hall de entrada e ali peguei a vassoura que tinha acabado de pousar quando filhote me chamou. Acendi a luz, abri a porta, com muito cuidado ia pisando com meu chinelo de oncinha para fazer um movimento forte o bastante para levar a aranha para onde eu queria, mas suave o suficiente para não machucá-la ou assustá-la demais. A vassoura seria minha aliada para conseguir pousar a bichinha em um dos degraus da escada, o plano era perfeito. Arthur me acompanhava, intrigado com o desfecho, eu ia conduzindo tudo direitinho, todo mundo feliz, a aranha subiu espontaneamente na vassoura, o que facilitaria bastante para mim, pois agora era só colocar a vassoura na escada e esperar a aranha sair andando em suas patas compridas e...
clic
Com um clique suave e quase inaudível a porta da minha casa se fechou atrás de mim.
Quarta-feira, Trump eleito, três graus e muita chuva lá fora, eu sozinha com filhote e os dois de pijama, trancados do lado de fora de casa.
Embora estivesse de calça, chinelo e casaco, me senti o próprio Claudio Marzo em "O homem nu".

Maldita aranha! (imagem daqui, ó: http://www.papodecinema.com.br/filmes/o-homem-nu)
Eu vestia calça, casaco e chinelo, mas Arthur estava descalço. Meu celular ficara do lado de dentro, assim como carteira com dinheiro ou qualquer outra coisa que pudesse me ajudar a encontrar uma solução digna para a situação.
O prédio só tem um vizinho, que não estava em casa, e nossos senhorios moram na casa ao lado. No dia anterior, para minha vergonha completa, eu já tinha tocado na casa deles e pedido que por favor abrissem a porta porque saí e larguei a chave do lado de fora da porta de casa. Então, não foi sem constrangimento que desci (depois de calçar no menino as botas que estavam do lado de fora de casa! que sorte!) e toquei a campainha. Chuva, vento, frio. Nenhuma resposta.
Voltei para dentro do prédio, sentei na escada. O que fazer? Não conheço ninguém aqui, marido ainda demoraria pelo menos mais 3h para chegar em casa, vizinho fora de casa, senhorios idem. Eu queria chorar. Eu queria fazer xixi. Conseguia escutar o som tocando dentro de casa, ver a luz do hall acesa.
Esperei.
Desci de novo. Mais um toque na campainha. Outro. Ninguém.
Voltamos para dentro do prédio porque meus dedinhos estavam começando a ficar dormentes com o vento gelado.
Sentei na escada, vi a aranha tentar escalar a parede, ajeitei a vassoura, tentei distrair Arthur.
Desci. Toquei. Nada.
Subi, me esquentei, tive uma ideia.
Desci, abri a garagem, peguei a chave do cadeado da bicicleta. Óbvio que não funcionaria, mas pelo menos iria me distrair. Quantas horas eu ficaria ali, naquele corredor? Tinha acabado de mandar uma mensagem para marido perguntando que horas ele voltaria para casa. Vejam que coincidência escrota! E antes de ver a resposta, clique.
Subi com a chave e ela nem sequer tinha a mesma espessura do buraco da fechadura, tudo que eu podia fazer era achar um ângulo qualquer e tentar criar uma espécie de alavanca para girar o tambor da fechadura. Óbvio que não funcionou.
Desci de novo. O corredor do prédio estava ficando gelado com tanto abre e fecha de porta da rua. Toquei a campainha. Nada. De novo. Nada. Arthur correndo, pulando, achando tudo uma graça (pelo menos isso!). Subi. Peguei a chave da bicicleta de novo. Tentei mais uma vez. Desisti e achei que se McGyver conseguia consertar um jato com chiclete e um chumaço de algodão, talvez eu conseguisse abrir a porta da minha casa desfazendo o aro que ligava a chave da bicicleta ao chaveiro. Desfiz o aro. Enfiei o arame dentro do buraco da fechadura e tentei todas as combinações possíveis de posição do arame + força na porta + chave da bicicleta formando uma espécie de alavanca. Não funcionou, é claro.
Desci de novo. O vizinho do outro lado chegava em casa, perguntei as horas, quatro e dez, lascou-se, acho que talvez seja bom pensar em ir ao mercado daqui a pouco porque lá tem aquecimento e está ficando frio, mas se eu for ao mercado, marido pode voltar para casa e ter um pequeno surto ao encontrar tudo aceso, som ligado e nós desaparecidos, melhor ficar aqui, mas marido só deve chegar lá pelas seis e meia, o que faço, Arthur, desce daí, meu filho. Respira.
Toquei a campainha. Nada. Quis chorar. Pensei onde eu poderia fazer xixi nas redondezas, mas aqui não é os EUA e nenhum estabelecimento comercial tem banheiro para clientes. E eu nem seria uma cliente, já que não tinha dinheiro para consumir.
Subi. Arthur canta com a vassoura. Arthur dança com a vassoura. Arthur quer saber da aranha. Tento, insistente e inutilmente, abrir a porta com o arame e a chave que não entra na fechadura. Desisto. Sento no degrau.
Ouço um barulho.
Desço.
Serão os senhorios? Será o vizinho? Será um delírio?
Não! Era meu próprio marido, ensopado, com as mãos duras de tanto frio e o olhar atônito de quem achou, por alguns segundos, que a mulher estava saindo de casa de pijama e chinelo. Ele veio mais cedo para casa, mal posso crer!
Ficamos uma hora e seis minutos trancados do lado de fora. E, ainda assim, quando entrei em casa, o Trump ainda estava eleito.
Que tempos, minha gente. Que tempos!

segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Sobre estar aqui

Quase todas as pessoas para quem eu conto que estou passando um tempo na Bélgica comentam comigos coisas do tipo "nossa, quem me dera!" ou "ah, que máximo!" ou "um sonho! uma maravilha!". E emendam com um "aproveite!".
Não chega a me irritar, mas acho curioso como as pessoas têm uma ideia completamente equivocada do que significa, na vida real, morar fora, sobretudo em um lugar temporário.
Se eu tivesse grana, a história toda seria diferente, porque eu poderia viajar e passear e curtir a ideia de "morar na Europa" que as pessoas têm. Mas como não tenho grana e a pouca que tenho está comprometida com coisas supérfluas, tipo pagar um teto e comer, então morar fora significa mesmo é passar perrengue em outras línguas e com as quatro estações do ano bem marcadas.
Também não estou reclamando. Nem posso. Mesmo com os perrengues é uma coisa incrível estar aqui, ver e viver coisas que eu nunca veria ou viveria no Brasil (para o bem e para o mal), perceber que estou começando a pescar uma ou outra palavra em holandês (palavras escritas, que fique bem claro, porque para as faladas eu precisaria de mais uns cinco anos aqui), comer chocolate bom todos os dias e beber cerveja famosa pagando bem menos.
Acho que estou desabafando, aqui, no meu cantinho, porque quando as pessoas me respondem, com os olhinhos brilhando, noooooooossa, que beleza morar na Bélgica, eu não posso e nem quero falar que é muito chato e deprimente ficar em um lugar onde só chove, ou que me sinto frustrada por ver meu filho sem conseguir se comunicar com as outras crianças porque as línguas não são compatíveis, ou que tem dias que me cansa pedalar e trepidar nos paralelepípedos das ruas centenárias da cidade só para ir até o centro ver gente e não deprimir, ou que a rotina avança nos dias mesmo falando holandês, ou que cuidar do pequeno 24h por dia não me deixa espaço (interno) para organizar outras coisas da minha vida, ou que estar com as malas já lotadas e não poder comprar materiais e brinquedos para distrair uma criança que não consegue brincar com outras crianças e que passa muitos dias enfiada dentro de casa porque lá fora está chovendo e fazendo 5 graus é mais do que frustrante, é exasperante!
Às vezes sinto como se eu subaproveitasse a oportunidade, mas não vejo muitas soluções, sinceramente. Ao menos, não vejo soluções que caibam no meu orçamento ou na gincana na qual parece que entramos em 2011 e da qual nunca saímos. Viajar não é uma possibilidade. Passear, comer fora, conhecer restaurantes e museus, tudo isso custa dinheiro (euros, não se esqueçam) e não é exatamente recebido com gritinhos de alegria pelo meu bólido.
Estar aqui é ótimo, mas muitas vezes se parece com estar em qualquer outro lugar do mundo. Sou grata pela oportunidade, mas não é raro que eu precise dar um sorriso amarelo ou uma resposta educada para as pessoas que vibram com a minha estada aqui, como se morar na Bélgica de repente sanasse todos os problemas do mundo e solucionasse boa parte das angústias medíocres que vivo. Estar aqui não é passear aqui, não é estar de férias aqui, não é apreciar tudo o que a Bélgica tem de melhor a nos oferecer. Estar aqui é ser estrangeira, e continuar sem grana, e ter rotina (sobretudo com e por causa do pequeno), e fazer supermercado com meia dúzia de frutas disponíveis, e lavar roupa (na máquina dentro de casa. LUXO!), cozinhar (blergh!), lavar privada, varrer chão, arrumar entretenimento, arrumar tempo para não deixar a peteca cair, se lembrar de que acabou o guardanapo e o café, é saber que em poucos dias estaremos empacotando tudo de novo, entrando num avião de novo, indo de novo para mais uma temporada temporária em outro país.
Estar aqui é fazer o estar aqui fazer sentido, enquanto estamos aqui. Faz sentido nossos passeios bestas para não pirar, faz sentido nossas tradições recém-inventadas, faz sentido abrirmos as exceções que abrimos e mantermos o que mantivemos. Estar aqui é, de verdade, estar aqui. A cada segundo. Sem espaço para idealizações. E isso é legal na mesma medida que é difícil. Estar.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Alguns fato aleatórios sobre Ghent

Moro em um bairro de imigrantes. Aqui, quase todo mundo veio de fora, e, salvo um ou outro belga, a língua que se escuta nas ruas não é o holandês. Digo isso porque talvez minha percepção de Ghent esteja um pouco (ou muito, sei lá) condicionada a esse fato.
Pois bem, tem umas coisas aqui que são tão curiosas que preciso partilhar com vocês!

1) Não tem Uber.
Eu já estava mal acostumada com o Uber e, ao chegar aqui, fiquei surpresa porque realmente não esperava por essa. Mas ok, vida que segue com muita bicicleta e tram.

2) Tudo fecha cedo e quase nada abre aos fins de semana.
Já falei disso aqui, eu sei, mas acho tão curioso isso que resolvi repetir.

3) As pessoas colocam a roupa para secar na calçada, do lado de fora de suas casas.
Fiquei chocada quando vi isso pela primeira vez. Nunca iria imaginar que as pessoas colocariam os varais no meio da rua! E, eu diria mais: as pessoas aqui ocupam bastante as ruas. Usam as ruas e frequentam as ruas.

Na quebrada da soleira...


4) Se você precisar ir a algum lugar, o caminho mais rápido, provavelmente, será o percorrido de bicicleta. Às vezes, a diferença de tempo é enorme, mas...

5) Ir de bike pode significar tomar chuva, chuvisco e toró na cabeça durante o trajeto todo. É que aqui, o tempo é bem ruinzinho. Tem até um postal que traz um desenho de um guarda-chuva e muitas gotas e a frase "Greetings from Begium" ("Saudações da Bélgica").

6) Os belgas sabem viver! Ao menos os daqui. Além de várias opções maravilhosas de esportes e áreas para praticar tais esportes, tal como o lago Blaarmeerseen (clica aqui para conhecer o site oficial), eles ainda têm as melhores cervejas, os melhores chocolates, os melhores waffles e inventaram a batata frita! Como se não bastasse tudo isso, trabalham o que precisam trabalhar, andam de bicicleta para tudo quanto é lado e têm uma relação absolutamente saudável com o próprio corpo, nada de neuras de pelancas e nem de necessidade de ostentar um físico perfeito.

7) Por falar em corpo, é bastante comum que o banheiro masculino seja sem divisórias. Isso significa que todo mundo pode ver os homens fazendo xixi nos banheiros: os homens lá dentro e, em alguns casos, onde o banheiro masculino fica perto do feminino, as mulheres desavisadas que olharem na direção errada na hora errada. E eu já comentei sobre o nojento "mictório" que vemos nas ruas, né? Vou poupar vocês, leitorxs, da retomada do assunto.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Ainda da chegada

Chegamos na casa onde estamos daquele jeito que eu contei, né? Exaustos por causa da gincana da mudança e com o fuso deixando tudo mutcho loco nas nossas vidas.
Nas primeiras tardes/noites que passamos aqui, estava quente. Bem quente. Acho que beirava os trinta graus e foi até mesmo emitido um alerta para altas temperaturas.
[Pausa para gargalhadas histéricas. Trinta graus e houve um alerta emitido por conta da temperatura extremamente alta! ahahahahahah]
Bom, mas o que fizemos logo no primeiro dia, assim que chegamos no calor? O que todo mundo faria: abrimos as janelas.
Pior decisão ever!
Já disse que Arthur é ultramegasuper alérgico a picada de mosquitos? Pois é, ele é. Simplesmente a pessoa com a alergia a mosquito mais bizarra que eu já vi. E olha que eu já fui parar no hospital e tomei 10 dias de antialérgico por conta de mordidas de mosquito!
Bom, acho que vocês já sacaram tudo: em Ghent tem mosquito a rodo no verão e Arthur acordou tooooodo mordido. Sorte é que dentro das malas, no mexe e remexe do vai-ou-fica, fiz questão de trazer não só os remédios da alergia (óbvio!), mas também um frasco de repelente que, acreditava eu, usaríamos em Angola.
Fica, então, a dica: se vierem para estas bandas no verão, não se esqueçam do repelente!

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Ghent: em que século estou?

Às vezes é difícil dizer em que século estou, aqui em Ghent. Não tem nada a ver com o castelo de quase mil anos, não. É que existem coisas aqui que me deixam intrigada, porque é tudo tão moderno de um lado, mas tão démodé do outro que decidi listas 5 coisas que parecem ser de séculos passados e 5 coisas que parecem ser de séculos vindouros.

5 coisas de séculos passados

1. Muita gente fuma muito;
2. E toda essa gente joga as guimbas todas no chão, que fica um nojo de sujeira;
3. Eles não usam capacete, embora vivam sobre bicicletas;
4. Os parquinhos têm cheiro de xixi e são bem sujos e eles usam isto aqui embaixo para que os homens façam xixi na rua. Eca!
5. Se você ficar doente e precisar de um remédio de noite, tem de entrar em contato com a polícia para que o farmacêutico seja acordado, pois não existe farmácia 24h na cidade.

Esta foto é de um "mictório" de Amsterdã, mas os daqui são iguazinhos! Eca!


5 coisas de séculos futuros

1. O lixo doméstico minuciosamente separado, lavado e coletado;
2. Bicicletas para todos e para tudo;
3. O expediente termina e as pessoas vão embora, porque viver parece ser tão importante quanto ganhar dinheiro para os belgas;
4. As crianças têm bastante liberdade e é bem comum ver meninos e meninas bem novos indo sozinhos para a escola;
5. Vira e mexe eles não têm governo!

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Outubro rosa

Apaguei. A história não era minha, e quando pensei em deixar o anonimato, converti para rascunho histórias com nome e sobrenome entre os que me conhecem. As minhas histórias ficam. As dos outros não podem, não devem. Só se eu for anônima, porque assim as histórias dos outros seguem protegidas. Optei por continuar anônima, mas apaguei aquela história de cinco anos atrás.
Publiquei no dia - vejam que coincidência - que exatamente um ano depois eu daria luz ao meu filho. E hoje - será que um ano antes de eu dar à luz de novo? será que um ano antes de algo grandioso acontecer de novo? -, mesmo sem vocês terem como acessar o começo, venho contar o desfecho.
Foi vencida pelo câncer de mama uma amiga querida.
Câncer é caminhão, e atropela os sonhos e os planos. E ela estava no caminho, indo em frente como todos nós, seguindo a vida do jeito que a vida deixava. E veio o câncer. E vieram muitas outras coisas depois dele. Coisas de que não vou falar, porque a história, mesmo eu sendo anônima, não é minha. E minha amiga fez o que fez a vida toda: enfrentou, seguiu a vida, buscando vida onde os outros enxergavam a morte. Foi viva, minha amiga, até o fim. Catou os planos e sonhos do caminhão, salvou o que não tinha se partido por inteiro e trilhou a estrada, com coragem. Cinco anos depois, ontem, minha amiga morreu. Deixou em mim saudade e sua história, marcada por coragem e busca incansável. Deixou um vazio no mundo, mas, em mim, também deixou algumas lições. Não vou partilhar todas, mas uma, faço questão.
Por uma infeliz coincidência, em outubro se concentram as campanhas de conscientização sobre o câncer de mama. É o outubro rosa. Por isso, peço licença a vocês, que vêm aqui me ler, para interromper a minha jornada e lembrar da jornada da minha amiga, lembrar às minhas leitoras que câncer de mama é o câncer mais comum entre as mulheres no mundo (no Brasil, ele ocupa a segunda colocação) e é relativamente raro antes dos 35. Minha amiga tinha 32 quando descobriu o câncer. Raro não significa impossível, significa menos comum. Amamentar reduz os riscos de câncer de mama, mas conheço mães que amamentaram e, ainda assim, tiveram câncer de mama. Riscos reduzidos não significa imunidade.
Por isso, façam o autoexame, mas gastem um tempinho para ler esta página, do INCA, que explica por que o autoexame, isoladamente, não é considerado uma ferramenta eficiente de redução das mortes por câncer de mama graças à deteção precoce.
Fiquem atentas a seus corpos, conheçam seus corpos, seus sinais, cuidem-se: vão a médicos, clínicas, façam exames, perguntem quando não tiverem certeza e não tenham medo de pedir segundas, terceiras, muitas opiniões se ainda resta alguma dúvida.
Minha querida amiga nos trouxe esta lição. Sejamos todas humildes e espertas para aceitar e aprender.
Fica a lição, mas fica também a saudade.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

O lixo

Se existe uma coisa diferente, bem diferente, ultra diferente na Bélgica é o lixo.
Nada de caçambas ultra-modernas ou inovações nas latas, mas coleta seletiva aqui é uma coisa levada a sério. Muito a sério.
Antes de continuar, peço licença para uma digressão autobiográfica.
Fui criada nos anos 80/90 e coleta seletiva era uma curiosidade na aula de ciências. Lá em casa, lixo era lixo. Coleta seletiva de fato, só quando alguém recolhia um parafuso no meio da rua para guardar "em caso de necessidade" ou quando a escola pedia sucata para fazer algum tipo de projeto de arte.
Nos EUA existe coleta seletiva, e foi lá - confesso com algum eco-constrangimento retroativo - que comecei a separar o que recicla do que não recicla. Minha melhor amiga vive em um esquema alternativo de habitação nos EUA e separa o reciclável, o não reciclável e o orgânico, que vai para a composteira virar adubo. Eu ainda não cheguei a esse nível. Admiro, entendo a preocupação, mas - confesso de novo - morro de nojo daqueles restos de comida fedorentos morando embaixo da pia.
Bom, aí eu vim morar na Bélgica.
[pausa dramática]
Se você está vindo morar aqui, meu conselho é: aprenda sobre o lixo. Que aprender holandês! Que se preparar para o frio, para uma realidade diferente! Que procurar saber sobre a cultura local! O que você precisa aprender agora, já, imediatamente é a separar o lixo certinho. Ah, e é claro, as siglas para os nomes (em holandês) dos grupos de materiais recicláveis.
São nada mais, nada menos que CINCO latas de lixo, fora a coleta seletiva de materiais especiais, como pilhas e baterias e outras quinquilharias. Dentro do nosso imenso quarto-e-sala temos que arrumar lugar para CINCO latinhas de lixo, que depois descem para as latonas de lixo do prédio, que depois são deixadas (só as sacolas, sem as latas) em frente à portaria do prédio nos dias certos da semana. Felizmente, temos quem cuida disso aqui no prédio e não precisei aprender os dias das coletas, mas dentro de casa eu preciso separar e lavar tudo direitinho. Temos um lixo para materiais orgânicos compostáveis, um para plástico e tetrapak, um para papel, um para vidro e um para lixo não reciclável. Perto daqui, mas já em outra cidade, tem uma sexta lixeira, para metais, que aqui vão dentro do lixo comum, segundo a vizinha, nativa, que me explicou pacientemente essa complexa realidade lixesca. É que cada cidade tem suas regras de coleta, dias de coleta e pontos de coleta. Reza a lenda que em Bruxelas as pessoas ganham uma advertência se entregam o lixo na data errada, e que já teve gente em outra cidade aqui perto que recebeu o lixo de volta porque não estava separado de maneira correta. Também ouvi uma história, que não consegui confirmar ainda, de que na mesma Bruxelas da advertência, o lixo é pesado e você tem uma cota mensal, que não pode ser ultrapassada sob pena de multa.
Confesso que depois do susto inicial, agora as coisas já não são mais tão misteriosas assim e fora uma ou outra coisa, eu nem preciso mais ler a embalagem para descobrir em qual latinha jogar meu lixo.
Então, fica a dica: se vier para a Bélgica, dá uma pesquisada de leve sobre coleta seletiva de lixo, porque aprender sobre isso sob a influência do fuso e os humores ébrios não é nada fácil.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Precisamos falar sobre Rozebroeken

Precisamos falar sobre Rozebroeken. Quer dizer, eu preciso falar sobre Rozebroeken, seja lá o que isso signifique em holandês. Mas, Ártemis, como é que você vai falar de uma coisa que não sabe o que é? Ah, eu posso não falar holandês, mas além de ter o google translator a meu lado, eu sei o que Rozebroeken significa em português, e ousaria até dizer em todas as línguas do mundo: o paraíso das águas cloradas!
Rozebroeken é, simplesmente, um complexo indoor de piscinas de águas deliciosamente aquecidas e brinquedos, e tobogãs, e escorregas, e uma piscina de ondas, e spa, e área com hidromassagem, e restaurante onde toda a família pode ir se divertir.
Fica a uma hora de caminhada daqui de casa (15 minutos de bike, se um dia eu perder o medo de me estabacar debaixo de um trole ou de beijar os paralelepípedos históricos) e foi a melhor coisa que fizemos aqui.
Dirão os eruditos: mas e o castelo de 1080? e os passeios de barco pelos canais? e a história, os monumentos e prédios históricos, a cultura flamenga?
Bróder, eruditos podem até ter filhos, mas eles com certeza não tem a voltagem do meu pequeno! Arthur passou uma semana falando do raio do castelo, levamos ele lá para dentro e o menino percebeu que era um museu, onde não poderia correr, gritar, pular, lamber o vidro e nem comer pedra (sim, ele tentou fazer tudo isso). Então passamos da etapa 1 para a etapa 14 da visitação, que por sinal era a última e terminava no pátio de areia entre o muro e o castelo, e ali ficamos até sermos expulsos pelo velhinho rabugento que tomava conta da portaria.
Dito isso, reafirmo: que mané essas coisinhas turísticas e históricas. Bom mesmo foi o Rozebroeken e seus milhares de litros cúbicos de água. Bom mesmo foi ir no tobogã com Arthur e ter um micro-enfarto quando ele, por três longos segundos, escapoliu do meu colo e tomou um senhor caldo no meio da correnteza. Bom mesmo foi levar um apitaço dos guarda-vidas porque Arthur estava ESCALANDO as estatuetas cuspidoras de água e gritando "olha, mamãe! tô aqui no alto!", e marido, míope em um grau ensurdecedor - quem é míope ou convive com um sabe que ocorre um fenômeno sinestésico e assim que umx míope tira os óculos, elx fica automaticamente surdx - gritando do outro lado "vai lá você, Ártemis!", embora ele estivesse a poucos passos do lugar  enquanto eu, tentando não desmaiar de fome, esperava com o dinheiro do troco na mão pelo sanduíche que pedi no restaurante. Bom mesmo foi entrar correndo, então, na piscininha infantil e levar aquele estabaco patético, em que só um lado da cara mergulha, bagunçando o cabelo parcialmente, mas arrasando por completo com a dignidade, só porque você fez um malabarismo inacreditável e salvou os cinco euros que estavam em sua mão. Vejam bem: entre a minha dignidade e cinco euros eu ando escolhendo a bufunfa!
Bom foi Arthur chegar em casa, pedir para comer, comer, pedir sobremesa, comer a sobremesa, pedir para escovar os dentes e passar fio dental (!!!) e, finalmente, colocar o pijama e dizer "mamãe, eu te amo e quero dormir". Como não amar Rozebroeken, esse lugar que acabei de conhecer, mas que já considero pacaraleo? Como não amar seu tobogã onde um gringo (local, na verdade) pinguço me canta? Como não amar seus guarda-vidas se escangalhando de rir do meu tombo?
Olha, se alguém que está lendo meu blog vier passear nestas bandas daqui, com ou sem criança, recomendo muito que vá visitar Rozebroeken e suas águas maravilhosas. Como é indoor, é programa também para inverno, viu?
E para completar minha paixão o lugar tem: 1) cercadinho/bercinho ao lado do restaurante para colocar o bebê molhado enquanto você come, sem precisar sair correndo atrás do engatinhante ou caminhante kamikase; 2) chuveirão coletivo e escaldante (ótimo para relaxar os pequenos depois da piscinada); 3) atividades para todas as idades (tem uma piscina IMENSA com estrutura para diversos esportes aquáticos e, pelo que entendi, eles têm aulas de hidro, natação e cia.); 4) passe familiar; 5) gente disposta a ajudar você com o braceletes high-tech que eles nos dão na entrada e que servem para acionar de um tudo ali dentro, inclusive as travas dos armários no vestiário).


Site oficial aqui.


Tobogã ou "rio selvagem".

Piscinhinha da perda da dignidade. No meio dá para ver a lagarta que Arthur escalou.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Por que perdi a lista de blogs que acompanho???

O que houve? Não consigo me lembrar de todos os blogs que eu acompanhava! Socorro!
Alguém tem uma luz, uma dica, uma palavra de apoio?

Não sei nem como (re)começar a lista!

PS: Como vocês já sabem, mas não custa lembrar, tem post novo toda segunda, quarta e sexta, e as postagens estão sendo programadas porque escrevo quando dá tempo, e geralmente não tenho tido tempo. Então, tardarei, mas não falharei em respostas e visitas, tá? <3

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

O drama das malas (e outras histórias) - parte 2

[Clica aqui para ver a parte 1]
Chegamos ao aeroporto com cinco malas: duas grandes, uma imensa (lembra que compramos uma mala? Pois é, escolhemos a maior da loja!) e duas malas de mão. E mochilinha do Arthur e carrinho, claro.
Sair do táxi foi uma prévia do que viria pela frente, mas resolvi viver um minuto de cada vez, caso contrário eu surtaria ali mesmo, no embarque.
Bom, chegamos com algum esforço e muito suor ao balcão de atendimento da companhia aérea. Ali, havia duas balanças, onde pesamos todas as nossas malas (e também nosso filho, já que não consegui marcar consulta com a pediatra antes de virmos embora) e constatamos, não sem um desespero profundo e intenso se apossar de nós, que havia sobrepeso.
Sobrepeso é um nome bem bonito para taxa extra, né? Para um "estão fodidos e vão ficar ainda mais duros antes de embarcar".
Abrimos as malas no aeroporto (por favor, visualizem a cena) e ponderamos como poderíamos passar uns quilos para as malas de mão. Bichinhos de pelúcia foram realocados, cogitamos jogar fora o tapete de brincadeiras do Arthur (também conhecido como Arthurópolis), retiramos um casacão pesadão do maridão e... tchanã! Todas as malas dentro do peso ideal, menos a gigante recém-comprada, que continuava com sobrepeso. Não tinha jeito, não iríamos conseguir redistribuir mais de dez quilos de tralha, então decidimos ficar dentro da primeira faixa de excesso de peso da bagagem. Paciência (tô aceitando frila, viu? se alguém do meu círculo profissional estiver lendo isto, por favor, mande mensagem e trabalho). Aí, fomos fazer o check-in e gerar os bilhetes de embarque. O que poderia acontecer de errado? Nada, certo? O mais difícil tinha passado.
ahahaha (riam comigo)
(mais um pouco)
Já falei aqui que Arthur tem um nome bem comprido e que isso, nos EUA, é uma coisa tipo bizarramente louca e esquisita. Pois bem: a máquina digitalizadora não conseguia ler os sobrenomes do menino e ficamos muuuuuuuuitos minutos tentando gerar os bilhetes. No fim, não conseguimos, e fomos advertidos pelo moço da companhia que poderíamos ter problemas no embarque por conta da fiscalização, que o atendente que fizesse a checagem dos bilhetes precisaria ser compreensivo, já que o nome do Arthur saiu errado/cortado. Ok. Tem outro jeito? Então vamos.
Vocês escolheram uma fila com um atendente paciente e compreensivo? Nem a gente. Precisamos chamar o rapaz da companhia aérea, que veio explicar por que o nome estava diferente do passaporte e tal e, finalmente, passamos.
Ufa! Sem mala, com check-in feito, de posse dos bilhetes de embarque... já sonhava com os sonhos lindos que teria dentro da aeronave. Com as horas que passaria relaxando, sentada, sem carregar mala, sem correr. Com as horas que passaria...
Ah, sim, onde eu estava? Estava, enfim, embarcando. Mas não sem antes ter um filho que se enturmou com duas crianças no saguão do aeroporto e tocou o terror, correndo e passando por baixo das fitas que formavam o serpear das filas de embarque em frente aos guichês. Passageiros sorriam, passageiros faziam caras de reprovação, passageiros eram empurrados e atropelados por aquelas crianças desgovernadas, mas eu deixei. E deixei conscientemente. Porque, pensei eu, é muito melhor que ele queira correr FORA do avião do que DENTRO. E bem melhor que ele gaste energia, que se canse e extravaze para que façamos uma viagem com uma criança cansada. E vocês sabem: criança cansada é criança feliz.
Bom, não posso dizer que foi um voo perfeito, mas também não foi um desastre. Tirando o fato de que eu morro de medo de avião e qualquer balancinho me faz estremecer, tirando o fato de que não sobrou comida para o Arthur (não a que ele queria, pelo menos), tirando o fato de que nos sentamos na última poltrona da aeronave e, acima de tudo, tirando o fato de que eu não consegui pregar os olhos durante absolutamente todas as horas de voo por causa do fuso e do estresse acumulado, o voo não foi terrível.
Terrível mesmo foi a chegada. Primeiro porque não dormi. Segundo porque a companhia aérea perdeu nosso carrinho e Arthur, cansado, sonolento e, óbvio, irritadiço, não encarou isso numa boa (nem eu). Terceiro porque depois da imigração, recuperamos as malas, que eram apenas três, mas ainda assim davam muito trabalho.
Vou resumir aqui as mais de DUAS horas que gastamos entre pegar as malas e ir reclamar da perda do carrinho: foi FODA.
Minha pressão deu chilique, Arthur deu chilique, marido deu chilique, eu dei chilique. Estávamos todos exauridos, esgotados. Acho que marido era o pior de todos, embora tenha conseguido dormir, porque parte da correria final ficou nas costas dele, incluindo reclamar o carrinho, já que Arthur só queria ficar comigo e ele precisou ir sozinho.
Vocês acham que acabou, só porque chegamos em solo belga?
Nã-nã-ni-nã-não!
Chegamos em Bruxelas. Moramos em Ghent. Ou seja: precisávamos pegar um fucking trem até a cidade e, de lá, sabe-se lá o quê mais.
Amigxs, deem aqui um abraço, deem. Eu não sei o que eu fiz na encarnação passada, mas deve ter sido pesado. Porque esse karma de viagem zicada não passa! Ártemis, viajando com caos since 1982.
Descobrir como pegava o trem, arrastando duas malas grandes, uma imensa, duas de mão e uma criança mau humorada de cansaço pelo aeroporto e pela estação de trem foi uma prova de resiliência e determinação incríveis. E, enfim, quando conseguimos comprar as passagens, ir para a plataforma de embarque correta (obrigada, Bélgica, pelos elevadores na estação de trem!), sentarmo-nos em um dos bancos duros do saguão... Arthur quer fazer xixi. O trem chegava em cinco minutos, não havia tempo para ir procurar um banheiro, não havia alguém para perguntar se tinha banheiro dentro do trem, não havia mais fralda que evitasse um acidente desastroso, mas existia a minha garrafinha de água, rapidamente transformada em banheiro.
Finalmente embarcamos no trem certo rumo ao destino certo!
E ele tinha banheiro (fica a dica).
Entre cochilos e "ohhhhs" por causa da paisagem, chegamos a Ghent.
Lembram que agradeci aos elevadores em estações de trem da Bélgica? Esqueçam!
Em Ghent não tem isso. A cidade é medieval e o que tinha eram uns portugueses solidários que nos ajudaram (obrigada! obrigada! obrigada) a descer com as malas por aquelas infinitas escadas da estação.
Cereja do sundae de cocô da nossa chegada foi tentarmos sacar dinheiro no caixa eletrônico para pegarmos um táxi e irmos para a cama, digo, para a casa que (assim esperávamos) tínhamos alugado pela internet, e o cartão ser BLOQUEADO porque nos esquecemos (não sabíamos que precisava) de desbloqueá-lo para ser usado fora dos EUA.
Acho que ficamos uma boa hora na estação de Ghent, ligando para o banco dos EUA, tentando resolver a pendenga.
Resolvemos, entramos no táxi, chegamos no endereço e... era uma casa de verdade! Ufa! O senhorio era um fofo, falou várias coisas, respondi como dava, mas lá pelas tantas me desculpei e expliquei que, para mim, eram quatro da manhã e ele, enfim, nos deu a chave da cama, digo, da casa.
O fuso me castigou, vocês já sabem, mas hoje eu vejo que o que não nos mata, nos fortalece: tinha uma celulite na minha coxa direita que foi extirpada com essa maratona de sobe-desce-puxa-empurra de malas. Quero dizer, foi extirpada no primeiro dia, porque aqui tem cerveja e chocolate, e a celulite está aqui de volta, firme e forte. Mas prometo que vou chegar o ao Rio sem ela: ainda temos três malas mais duas de mão para arrastarmos de volta, todo este trajeto de novo. E depois de novo. E de novo. E de novo...

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

O drama das malas (e outras histórias)

[Vai amamentar porque é textão!]

Já falei que eram cinco. E já falei que teve drama. Mas acho que ninguém imagina o nível de drama. Só de lembrar me dá vontade de chorar, de jogar todos os meus trapos numa fogueira de adoração ao minimalismo e até mesmo virar adepta ao naturalismo, quem sabe? Afinal, ainda temos no horizonte Brasil, Angola e Chicago de volta. Com as malas.
Tudo começou, óbvio, em Chicago.
A casa era pequena, mas não era minúscula, e a quantidade de tralha que a gente acumula ao longo dos anos é realmente impressionante. Como disse marido, até hoje a gente espera a ligação do guarda-móveis dizendo que a porta de aço do nosso cubículo explodiu de tão cheio que ele estava.
Mas então, ainda lá em Chicago a gente fez a triagem das coisas que seriam guardadas e das que seriam descartadas. Muita coisa foi embora, muita coisa ficou, mas a gente ainda tinha as malas a serem feitas.
Começou o drama do combo amplitudes térmicas + crescimento do Arthur + não saber como lavaremos roupa em Angola. Tentei montar uma mala enxuta, mas existem coisas que precisavam vir com a gente, para dar a Arthur um sentido de continuidade, de pertencimento à próxima casa, né? Eu entendo que vamos ficar um ano fora, que é provisório, que as coisas profundas que compõem um lar não vão dentro da mala, mas dentro da gente. Acontece que Arthur tem 4 anos e não estava curtindo nada aquele bando de "encaixota", "joga fora", "doa".
Bom, fizemos nossas sete malas. Sete? Ué, não eram cinco?
Calma! Eu chego lá.
Fizemos sete malas na véspera de levar as coisas para o guarda-móveis, em meio a um processo de "desentulhamento" nunca visto antes, em meio a uma obsessiva limpeza de cantinhos e detalhes para não pagar multa (tem uma lista de coisas que você precisa limpar antes de entregar o apartamento - coisas, inclusive, que NÃO recebemos conforme o manual). Fizemos as malas logo depois que a última visita foi embora, porque, sim, tivemos 3 visitas nas semanas finais de encaixotamento. Fizemos as sete malas até de madrugada, mesmo sabendo que no dia seguinte, bem cedinho, nosso vizinho parça viria nos ajudar a carregar o caminhão com os móveis e as caixas que iriam ser armazenadas no guarda-móveis.
Pausa técnica: não sei se todo mundo sabe, eu não sabia, então vou contar. Sabe como as pessoas se mudam nos EUA? Tem duas maneiras que eu conheço: você contrata um caminhão com gente para transportar suas tralhas e deixa um rim como forma de pagamento, ou você contrata um caminhão, que será dirigido e carregado por você, e faz tudo por conta própria mesmo. Adivinhem qual foi a nossa "opção"? Isso mesmo. Alugamos um caminhãozinho que, com a ajuda do nosso vizinho camarada-salvador-da-pátria, enchemos com nossos móveis e tralhas a serem levados para o guarda-móveis. Lá no guarda-móveis, a mesma história: você faz tudo. Era um dia quente. Eu achei que fosse ter um treco, juro! Suei como se estivesse na UERJ nos áureos tempos adolescentes, dentro daquelas salas de aula sem ar nem ventilador e que refratavam os 50 graus do Maracanã para dentro das paredes de concreto. Carreguei muito peso, levantei caixas maiores que eu, equilibrei tralhas em posições que dariam inveja ao mais flexível praticante do Kama Sutra, fiz caber em um espaço de 25 pés quadrados (seja lá quanto for isso) três anos de Chicago + lembranças imperdíveis de 30 anos no Brasil. Ou seja: coisa bagarái. Devo tudo isso aos meus anos de prática com Tetris. 
Mas voltemos às malas.
As malas, então, ficaram ali no apartamento, semi-abertas, porque não tínhamos mais cabides, nem cômodas, nem nada. Na verdade, tínhamos tudo isso, mas guardado ou esvaziado.
Pois bem, fizemos o transporte das coisas, voltamos para um apartamento cheio de eco com as malas, e só as malas, já que todos os móveis estavam guardados. Foram dois dias até irmos para o hotel onde ficamos nos dois dias anteriores à viagem. Dois dias tensos. Dois dias desconfortáveis, dormindo no chão (menos Arthur, que ficou com o sofá velho que depois jogamos fora), comendo comida congelada com talheres de plástico e muitas outras coisinhas altamente precárias.
As malas, sete, não cabiam em um táxi comum. Uber XL era caro. Táxi XL idem. Decidimos, então, aproveitar a minivan que tínhamos alugado para levar tudo até o hotel. O carro não entrava na garagem porque era mais alto que as vigas, então manobramos com a ajuda do garagista, que vendo nós três descarregar malas e mais malas (e um painel solar IMENSO), perguntou se iríamos ficar meses, ao que respondemos "dois dias". Queria ter tirado foto da cara do homem. ahahah
Bom, primeiro dia foi dedicado a deitar nas camas macias e limpas do hotel, a tomar banhos quentes e longos, comer comida quente e prearada na hora, a ir à piscina e... a resolver milhares de pepinos que surgiram de última hora, o que anulou por completo nossas tentativas de desestressar. Lista esta que incluiu sair para comprar uma mala nova, bem grandona, porque descobrimos que uma das nossas tinha se quebrado. Que beleza!
Bom, o outro dia já era a véspera da viagem, então precisaríamos terminar de resolver a pepinada (que parecia, na verdade, um bando de ratos se reproduzindo alucinadamente) e começar a focar no deslocamento em si, nos processos de saída e chegada em dois países diferentes e essas coisas que vocês devem saber. Corre daqui, corre dali, a noite chegou, Arthur dormiu e fomos passar o pente fino no quarto (para não deixar nada para trás), nos documentos (idem) e, claro, reorganizar as malas. Tudo lindo, tudo maravilhoso, tudo fluindo. Até que marido resolveu cuidar da nossa chegada em Ghent (vou escrever o nome da cidade em inglês mesmo porque acho caído Gante). Decidimos agendar um serviço de shuttle e lá no contrato vinha dizendo que eles não cobravam as malas "normais", uma por passageiro mais a de mão. Opa! Acendeu o alerta vermelho e marido foi ver no site da companhia aérea. Eu, atrás dele, afirmava, convicta: claaaaro que são duas malas de até 32kg para cada um! Óbvio!
ahahahahahahahaha (riam comigo)
Lemos e relemos diversas vezes para nos certificarmos de que, sim, pela primeiríssima vez na vida (cof! cof!) eu estava errada. As regras para viagens ao Brasil são as que falei: duas malas de até 32kg. Mas, para a Europa, é uma malinha só e o peso não pode ultrapassar 23kg.
Neste momento, um letreiro luminoso se acendeu em minha testa, piscando em neon vermelho: FODEU! FODEU! FODEU!
Eram onze da noite, véspera da nossa fucking viagem, e tínhamos acabado de descobrir que precisaríamos deixar QUATRO das malas que estavam conosco. Como fazer isso? Onde colocar as QUATRO malas que precisaríamos deixar? A que horas terminaríamos de fazer tudo?
Nessa hora eu tive vontade de deitar em posição fetal e chorar até dormir. Mas eu dormiria rápido, e era véspera da viagem, então a única possibilidade era abrir TODAS - vou repetir - T-O-D-A-S as nossas malas e ver, peça por peça, o que iria e o que ficaria.
Conseguimos, com muito suor e esforço. As malas, que eram sete (fora as de mão e o painel solar), se transformaram em três + duas de mão. Marido ainda teria a árdua missão de levar e encaixar, sabe-se lá como e onde, as quatro malas remanescentes no nosso depósito já abarrotado até o teto (literalmente)!
Eram duas e meia da manhã quando fechamos o último zíper. Exaustos, desmaiamos por algumas horas, até que fomos acordados pelo despertador e recomeçou a correria: corre para tomar café, corre para pegar um táxi e levar as malas até o guarda-móveis, corre para fazer check-out, corre para dar tchau para os bibliotecários (sim, importantíssimo para nós), corre para resolver os últimos pepinos que exigiam nossa presença física, corre, corre, corre. Corra, Ártemis, corra! No primeiro final, Ártemis e família não conseguem. No segundo final, Ártemis e família se separam, marido embarca sozinho, ela e Arthur choram porque não conseguiram completar as etapas obrigatórias da gincana e perderam os passaportes. Mas no terceiro final, que foi o que decidi viver, tudo deu certo, aos trancos e barrancos, e fomos de táxi XL, falando francês, até chegarmos ao aeroporto.
(continua...)

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Como é a cidade?

Moramos no interior da Bélgica, em uma cidadezinha medieval que uma gracinha e que, como muitas cidades da Europa, tem castelo, tem igreja, tem ponte. Mas a coisa mais linda, mais perfeita, mais divina e maravilhosa que temos por aqui é:

A máquina de lavar que fica DENTRO do meu apartamento.

Eu fiquei tão feliz de ver o aparelho que tive vontade de abraçar meu senhorio, chorando copiosamente em seu colo belga. Me segurei porque fiquei com medo de ele cancelar o contrato, mas depois que ele saiu e me deixou a sós com essa belezura, devo ter ficado uma meia hora admirando seus botões. Metade por encantamento, claro. Mas a outra metade foi mesmo tentando entender o holandês, essa língua do capeta. Achei um "Sporten" na máquina e agora ela deve estar lá, no canto dela, tendo certeza de que sou uma maratonista. Aliás, todos aqui em casa. É que eu lavo roupa duas vezes por semana. E a verdade é que, se eu pudesse, me lavava usando a máquina! Ou fazia um álbum de fotos inteiro só com a máquina de lavar. Toda minha. Toda pronta para lavar minhas roupas, a qualquer hora do dia, sem que eu precise catar moedas ou levar cartão de crédito, sem que eu precise sair do quentinho do meu lar, sem que eu precise levar comigo Arthur, sem que eu precise me organizar com antecedência ou arrastar uma saca IMENSA de roupas sujas escada abaixo, depois escada acima, limpas. Agora eu posso comprar o sabão que eu quiser, não precisa ser mais só em pods. Agora, ninguém tira as minhas roupas lavadas, minhas calcinhas limpinhas e deixa ali, em cima do tampo da máquina, até que eu possa vestir Arthur, me vestir, pegar cartão, chave e paciência para ir até a lavanderia colocar as roupas para secar. Agora, eu posso até ser mais Montessori e delegar a função "lavar roupa" para meu pequeno.

Tem gente que vem aqui para a Bélgica e pira nos chocolates, nas batatas fritas (que eles juram que inventaram - numa briga com a França meio no estilo Santos Dumont X irmãos Wright), nos waffles com sorvete e caldas mil, nas cervejas. Tá, tá, tudo isso é uma delícia, tudo isso é maravilhoso, mas me deixa. Tô surtada de paixão na minha máquina de lavar própria, que só lava roupa na função "Sporten", mas que fez com que o drama da mala fosse atenuado.

O quê? Que drama da mala? Xiii... vou contar em outro post.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

ConFUSOs

Já falei que estou meio perdida no fuso, né?
Mas ainda, Ártemis?
Ainda.
Sete horas são sete horas, minha gente. Sete horas significa que meu corpo quer almoçar quando deveria estar indo dormir. Que ele quer acordar quando eu deveria estar no parquinho, brincando com filhote. Que ele quer dormir quando eu deveria estar acordando. Nem vou comentar na disposição nível velocidade 5 da dança do créu que me domina por volta das meia-noite/uma da manhã, me fazendo escolher este lindo horário para malhar. Ó que beleza.
Tá todo mundo bem louco aqui. Quero dizer, nós, os adultos. Arthur já tirou de letra o fuso, a casa e não duvido nada que no fim da nossa curta estada aqui ele já esteja falando frases completas em holandês E francês.
Bom, mas eu tava falando que ando meio confusa, né? Pois vejam o nível do meu desespero: além de frequentar estabelecimentos comerciais aos quarenta e cinco do segundo tempo e me lascar de fazer abdominais uma da matina, eu também vou fazer xixi no corredor do prédio. Num dos primeiros dias, de madrugada, me arrastei para fora da cama a fim de fazer meu xixizinho noturno. Pé ante pé, devagar, saí do quarto, abri a porta e parei no meio do corredor do prédio. Desnorteada, cheguei a pensar "puxa, nem tinha reparado que tem escada no banheiro". Não era banheiro, não era, era cilada-cilada-cilada-cilada (é novinhx e não entendeu a referência? Clica aqui).
Também já fui a mala do zapzap, mandando mensagens animadas para a família, dando bom-dia, celebrando a vida e a alegria de viver às quatro da matina, horário de Brasília.
Vontade que dá é de andar com três relógios no pulso: um para cá, outro para o Brasil, mais um para Chicago.
Mas, nem só de almoço na hora de jantar e sono somente às seis da manhã vive esta que vos escreve! Não, não! Pensem só que maravilha é pegar o telefone às nove da noite, depois de jantar, depois de colocar criança para dormir, abrir uma cervejinha, se lembrar, beirando o desespero, que precisava ter ligado para o banco nos EUA para resolver uma coisa e... descobrir que ainda é horário comercial por lá?!
Para terminar, aviso que estou abrindo um bolão: quando conseguirei me adaptar, enfim, ao fuso e ir dormir entre dez e meia-noite?
Tô tensa. Tô sonolenta. Tô bem doida.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Tô bem, obrigada!

Uma das particularidades da cidade onde vivo atualmente é que ela fecha cedo. Não é incomum ver todas as lojas com as portas cerradas às seis da tarde. Sete da noite, então, o raro é ver alguma coisa ainda funcionando.
Mas na primeira semana, eu não sabia, né? Ainda no fuso de Chicago, saí para fazer compras no mercado aqui perto às 18h45, horário local, 11h45 da manhã, horário interno de meu corpo recém-chegado.
Outra peculiaridade daqui, que não chega a ser peculiar, apenas um fato, é que moro em uma cidade onde a primeira língua é o holandês.
Vejam bem, eu falo português, me viro no inglês, arranho francês, compreendo espanhol, pesco alguma coisa de alemão e italiano. Mas holandês é complicado. Holandês é muito diferente de qualquer input linguístico que eu tenha: sintaxe, prosódia, léxico, tudo é muito novo para mim.
Então, estava eu no mercado, às 18h55, embora meu corpo cresse piamente que era quase hora do almoço, tentando descobrir se o produto que eu tinha em mãos era um detergente ou um suco quando vem uma senhorinha de cabelos curtos, óculos de aro de metal e colete com a logo do mercado e fala comigo. Eram muitas informações ao mesmo tempo: estômago roncando, olhos caçando uma língua conhecida no rótulo, ouvidos escutando aqueles sons desconexos. Parei o que fazia e disse, em inglês, confiante: "Ah, não, obrigada, eu estou bem."
Por que fiz isso? Só Freud talvez saiba. Mas foi o que deu para arrumar naquela hora, tirar da cartola uma frase aleatória em inglês que traduzisse apenas "me deixe em paz" de maneira educada.
A moça parou de andar e respondeu, então: "senhora, estou falando que estamos fechando a loja."
Sorri, agradeci mais uma vez, me enfiei na fila e voltei para casa com: um biscoito salgado que não queria comprar, dois pêssegos, uma fome desgraçada e um produto que não descobri até hoje se era suco ou detergente.
Brincadeirinha: era suco.

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Cuidado, olha a Cona!

Uma das coisas mais loucas daqui da Bélgica são as ruas. Nesta época do ano (não sei em meses mais frios), elas são abarrotadas de um tudo: carros, bicicletas - muitas bicicletas -, patinetes, motos, troles, ônibus, caminhões, pedestres, cachorros, carrinhos de bebê. Há trechos imensos em que a calçada e a rua propriamente dita não têm limites claros e definidos, e a sensação que dá é que testemunharemos acidentes horrorosos entre uma criancinha andando de bicicleta e o trole que vem vindo, ou um patinete a toda velocidade e aquele velhinho de bengala ali na frente, ou... vocês entenderam, né?
Nesse contexto - e considerando que bicicletas aqui são realmente muito populares e trafegam por todos os lados, inclusive em cima de calçadas e em vias partilhadas com pedestres -, ando tensa. Motores são fáceis de serem escutados, mas muitas coisas que circulam por aqui são bastante silenciosas, e eu nunca sei se estou na calçada, na via compartilhada, no meio da rua.
Numa dessas, estava eu com a família completa, contemplando um castelo no caminho - Europa tem disso, né? Tá andando e pá!, um castelo de mil anos -, quando ouvi um barulho na calçada. Era uma bicicleta, seguida por um patinete. Saltei para a rua, ou o que achei que era a rua, e fui advertida pelo marido:
- Cuidado, olha a Cona!
Ergui os olhos e vinha, atrás de mim, um imenso caminhão vermelho com CONA em letras brancas. Dentro dele, dois homens que não faziam a menor ideia de que, na minha língua, eles dirigiam uma imensa vulva.
Bélgica, o país onde o tráfego é tão louco que até mesmo uma cona poderia ter me atropelado!

Bicletas, pessoas, carros, ônibus, troles, igrejas e quase nenhuma separação entre rua e calçada.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Roteiro

[Para ler ao som de "Não vá se perder por aí"]

Obrigada pelas mensagens de carinho e boa sorte (vamos precisar! sobretudo se as mudanças todas se mostrarem "interessantes" como foram seus primeiros momentos - vocês verão! Não percam as próximas postagens!).

Vamos nos mudar duas vezes, e depois de volta para Chicago. Ou não. Ou sim. Aguardemos. Tudo pode acontecer. Mas que fique bem claro que só nos resta conquistar a Oceania e um exército a nossa escolha. Rá!

Nosso roteiro, então, está assim: Chicago ---> Ghent ---> Braseeeel (queria encontrar as amigas blogueiras, já soube de antemão que teremos uma edição especial da Primavera das Mulheres! Olhaí a oportunidade!) ---> Angola (interior, porque na minha vida nada é simples como parece ser) ---> ?
A interrogação é porque provavelmente iremos ao Brasil de novo, antes de Chicago, mas quem sabe? Quem não sabe? Tá difíçu, povo! Vou atualizando.
Ah, e para quem não reparou, agora as postagens são "periódicas" (conforme minha v1d4 l0k4 permitir): segundas, quartas e sextas. E já tem post programado até 5 de outubro!

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Belgicando

Entonces, esta (assim como as duas anteriores) é uma postagem programada. Porque, afinal, pensa só na loucura que é/foi fazer uma mudança internacional com filhote a tiracolo?
Pensou? Então multiplica essa conta ae porque também teve fechar e entregar apartamento nos EUA, alugar apartamento na Bélgica, empacotar, guardar, lavar, doar, jogar fora o apartamento inteiro dos EUA e, de brinde, mais 5 malas para fazer. Mas não quaisquer malas, não! Não, senhoras e senhores! Malas com roupas para: Bélgica (amplitude térmica de -4 a 30 graus), Brasil verão-Rio-40-graus (ok, essa aqui é moleza: biquíni, sunga e uns panos leves pra jogar por cima) e Angola (amplitude térmica de 13 a 30 graus). Mas não para por aí, lógico! Porque Arthur sai dos EUA com 4 anos e pouquinho e volta com 5 anos completos. Nesse meio tempo a gente espera que ele cresça, né? Comprar roupa na Bélgica pode ser em conta para os Belgas, mas pagando em Euro não fica em conta para a minha pessoa, e roupas no Brasil e em Angola (comparando com os preços dos EUA) não valem à pena. Então, tive de separar as roupas que ainda davam um gasto e comprar peças-chave que durassem um tempinho sem parecer que filhote estava usando as roupas do pai. Se consegui é um mistério que apenas o tempo dirá.
Mas essa postagem aqui é para dizer que tenho muitas coisas para contar. Coisas engraçadas, coisas bacanas, coisas loucas e surreais, como só acontecem na minha vida.
Pega aí seu waffle, sua cervejinha, seu chocolate e vem belgicar comigo, vem!

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

O segundinho virou segundinha

Pois é, meu povo. Meu segundinho virou segundinha. Aliás, segundinha e terceirinha, logo de uma vez!

Pode me xingar porque fiz mau uso do título e não tem nada na minha pança além das pelancas que coleciono com rigor.
É que em vez de parir um rebento, farei uma segundinha mudança. Vamos para logo ali, na Europa, e depois para um bocadinho mais adiante, na África. Onde tudo começou, inclusive este blog, esta loucura selvagem.
Com isso, óbvio que meus planos de engravidar de novo foram adiados, sem previsão de volta.
#todaschora

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Surpresa!

A vida anda pacata?
Tá tudo uma tremenda pasmaceira?
Todo mundo fazendo tudo igual?
Sem emoções?

Então, vem com a gente que nós temos novidade!

Uma grande surpresa, que vai virar nosso mundo de cabeça para baixo. De novo!

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Nosso lindo balão azul 2

Há pouco tempo, estivemos novamente na casa de uns amigos queridos. Aqueles mesmos que nos receberam no dia do balão azul. A tal festa do balão azul tinha acontecido algumas boas semanas atrás e eu mal me lembrava do episódio, sobretudo com Arthur correndo para cima e para baixo, brincando horrores com o amigo aniversariante, querendo roubar os brigadeiros da mesa e todos os pães de queijo da bandeja - sim, festas com brigadeiros e pães de queijo! <3
Ou seja, eu nem me lembrei de toda aquela choradeira do balão e passei horas muito divertidas com o filhote.
Na hora de ir embora, Arthur cisma com o quê? O quê? Isso mesmo: um balão azul!
Como gato escaldado tem medo de água fria, peço autorização para a anfitriã, retiro o balão escolhido por Arthur e vou embora com o brinquedo, me certificando de que o dito cujo está bem seguro e não será, sob hipótese alguma, esquecido.
Faço isso, mas acho que Arthur nem se lembra do ocorrido, afinal ele estava sonolento, depois daquela noite/madrugada ele nunca mais tocou no assunto e tudo isso aconteceu há algum tempo já.
Ledo engano: assim que entramos no uber filhote se vira para mim e exclama, todo feliz: "que bom que dessa vez você não esqueceu o meu balão azul!"
Segura esse cometa!

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Café de lúpulo

Domingão de sol e depois daquele almoço lauto que dá vontade de hibernar por uns cinco dias tudo o que os adultos precisavam era de um café. Starbucks é como maria-sem-vergonha aqui, mas estamos cansados do café de lá (que nem achamos bom, apenas conveniente) e decidimos ir em um lugar aqui perto, um onde nunca tínhamos ido, um que foi avistado pela minha própria pessoa quando passava de táxi nas redondezas.
Desenho, é o nome, jurei. Que nome engraçado, responderam.
Ficava a umas três quadras de onde estávamos, avisei. Tudo bem, o dia está lindo, vâmu.
Fumo.
Passamos os mercados, a estação de trem, uma obra, encontramos uma conhecida, contamos para ela onde íamos, nos despedimos da moça e, enfim, chegamos.
Uma graça o lugar: mesas coletivas, clima descontraído, balcão alto de frente para a rua, pessoas sentadas ali, vendo a vida passar.
Sorrio, abro a porta e... uma lufada do aroma in-con-fun-dí-vel de cerveja, muita cerveja me atinge. E foi assim que descobri, em um domingão ensolarado, que o café lindinho pertinho da minha casa é, na verdade, uma cervejaria com bebidas de fabricação própria. Minha sorte é que errei o nome na hora de contar sobre o "novo lugar incrível" para a conhecida. O nome é Caderno de Desenho, e café ali, só se fosse feito de malte, lúpulo e água.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

O resgate oriental

Domingo de sol e todos no parque. Um festival de artes movimenta a cidade e parece que todo mundo está ali, na beira daquele laguinho artificial com patinhos nadadores.
Encontramos Lola, a menina fofa que corria com Arthur na aula de música. Conversamos um pouco, as crianças correm, tudo bem.
Lola vai embora e Arthur decide que quer ir ver os patinhos.
Lá na beira do laguinho tem pato e passarinho, e a brincadeira é correr na beirada, sobre o calçamento de pedras, para espantar as aves. O calçamento é estreito e de pedra, por isso, fico em pânico e vou junto. Falo 237854 vezes para ele parar de correr porque pode cair na água ou se estropiar nas pedras. Por 237854 vezes ele me ignora. E corre. E ri. E acha um barato arriscar cair na água cheia de cocô de pato.
Decido falar mais uma vez, porque sou mãe e recebi treinamento ainda na maternidade para efetuar repetições no nível "batendo recorde do Guiness Book".
Assim que termino de proferir o último fonema da advertência acontece aquilo!
Um oriental, que estava correndo junto a Arthur, brincando com ele de um pique-pega apavorante, usando uma mochila maior que seu corpinho de 3 anos, este menino resolve cuspir no laguinho artificial. Com os dois bracinhos jogados para trás em busca de equilíbrio, ele inclina o corpinho para a frente, vê o reflexo de seus lábios cuspindo na superfície do lago e, antes que até mesmo um pato consiga dizer "quém", cai de cara na água. Arthur continua correndo e pulando. A mãe da criança está em outro mundo, de costas para a cena, assistindo ao show de jazz que acontecia. Então, vendo o oriental ainda submerso naquela poça de concreto com pouco mais de dois palmos de profundidade, consigo me certificar de que Arthur não será o próximo a beber um drinque de cocô de pato e resgato o pequeno rapaz. Nos segundos que levei até alcançar o lugar onde ele caiu de cara na água, o menino conseguiu, sabe-se lá como, dar uma espécie de cambalhota e ficar de pé no lago. Por isso, quando chego, tudo o que faço é içar o garoto, ensopado e coberto de excrementos de pato, colocando-o de novo no calçamento de pedras. A mãe ainda está assistindo ao show, então fico com ele, olho para ter certeza de que está bem, sem cortes, machucados ou qualquer outro problema evidente. Ele parece bem. E só quando a mãe olha, finalmente, é quando ele começa a chorar. Assustado, provavelmente com frio. A mãe o conforta, o leva embora.
Sou parabenizada pela pequena multidão que estava acompanhando o show e viu tudo o que aconteceu.
Pego Arthur pela mão. Ele gargalha. Ri muito do oriental que mergulhou no laguinho. Se diverte de verdade. Eu sei que empatia não é o forte de crianças novinhas, mas como é de pequeno que se torce o pepino, tento falar que o menino chorou, que a gente não pode rir, mas não consigo, porque estou gargalhando junto com meu filho. Recebendo parabéns pelo resgate de pessoas que também gargalham. Indo contar, com o riso frouxo, a história para outros que assistiam de longe, e que também gargalham.
E assim, queridxs leitorxs, resgatei o oriental às gargalhadas - espero que uma ação neutralize a outra e eu fique com o karma zerado - e agora tenho um filho que não pode ouvir falar em cocô de pato sem ter um acesso de riso incontrolável.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

O nosso lindo balão azul

Rio de Janeiro. Fim dos anos 1980.
Dentro do carro lotado, crianças amontoadas nos colos dos adultos - época em que cinto de segurança servia para a gente tropeçar quando entrava no banco de trás por uma das duas únicas portas existentes (carro de 4 portas era luxo! Eu me lembro que meu carro favorito era um Monza 4 portas. Achava lindo, achava chique, achava moderno) -, meu primo, que devia ter uns 3 ou 4 anos, chorava. E reclamava. E dizia, incessantemente "eu quero o meu nariiiiiiz".
O nariz em questão era uma lembrancinha da festa de onde acabáramos de sair. Um nariz de palhaço, daqueles de plástico. E ele, exausto, cheio de sono, inconformado porque o nariz estava guardado, passou o trajeto inteiro lamentando sua tristeza.

Chicago. 2016.
Entramos no Uber 4 portas e Arthur, depois de dar boa-noite ao motorista, pergunta "cadê o meu balão azul?".
O balão azul em questão era, de fato, um balão azul. Tínhamos acabado de sair de um aniversário na casa de uns amigos e o balão, no meio do processo não-quero-ir-para-casa-buáááá, ficou para trás. Entramos no carro com mochila, saco de papel recheado de gostosuras e Arthur. Nada de balão. Arthur, quase trinta anos depois do meu primo, foi fazendo uma nova edição do "eu quero o meu nariz" ao longo de toooooodo o trajeto. Cochilava, acordava, pedia o balão. Chorava, se acalmava, dormia. Acordava, chorava, queria o balão azul. Soluçava, relaxava e dormia. Trinta quilômetros e um engarrafamento do Lollapalooza depois, chegamos em casa com ele, enfim, sem som e sem imagem.
Colocamos o rapaz na cama, certos de que, depois de um dia imenso e exaustivo, Arthur dormiria pesado até meio-dia do dia seguinte e fomos nos deitar também.
Uma da manhã ele acorda chorando. Eu quero o balão azul.
Negociamos, conversamos, ponderamos e fazemos um acordo: quando o sol chegar, vamos comprar um lindo balão azul. Ele dorme, nós dormimos, até que, duas e meia da manhã, ouço um choro sentido e a indefectível frase "eu quero o meu balão azul!". Olha, cuidado mesmo com o que vocês fazem com a filharada por aí, porque essa coisa de inconsciente é real e incansável. Das profundezas do império do sono vem o desejo sublimado e, aí, salve-se quem puder, meu povo!
A essa altura, mais nada adiantava: nem conversa, nem promessa, nem abraço. Nada!
Até que marido (já disse que ele é gênio?) pega o telefone no meio da madrugada e anuncia: vou ligar para a Letícia! Arthur para de chorar, pisca os olhinhos molhados, dá três soluços para recuperar o fôlego e para, enfim, de repetir seu mote das últimas três horas e meia. Presta atenção. Marido faz o teatro completo, digno de Oscar: disca, coloca o celular na orelha, conversa, com direito a pausas dramáticas e muita função fática. Combina com Letícia que ela vai guardar o balão e que amanhã iremos todos buscá-lo. Claro, obrigada, beijos, até amanhã.
Arthur pisca os olhinhos sonados, suspira e, então, aceita. Dormimos todos, pegando carona nessa cauda de cometa que, a julgar pela reedição dos anos 1980, deve ser o Halley.

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Mãe carrasca

Arthur resolveu comer. Foi até a geladeira, abriu a porta e já ia escolhendo umas uvas quando eu vetei.
Não. Já tinha dado o aviso dos cinco minutos para o jantar.
Ele ficou chateado, claro. Disse que estava com fome, argumentei que tinha o jantar, disse que não queria agora. Negociamos.
Expliquei que ele podia comer salada. Qualquer verdura ou legume que escolhesse. Ele quis alface.
Tentou, então, beber leite. Não antes do jantar, expliquei. Pediu água. Me senti carrasca.
Aí, me chamou para sentar ao lado dele no quarto, disse que queria conversar. Pousou o pote com alface na cadeira, a garrafa de água também e conversou. Conversamos.
No meio da conversa, ele avisa que a alface era pipoca e a água era leite com chocolate.
E eu ali, vendo meu menino comer alface e beber água, me sentindo a mãe mais carrasca do mundo.
Queria fazer todas as vontades, fazer as coisas difíceis por ele, isolar sua alminha pura de todas as coisas ruins, frustrantes, decepcionantes, amedrontadoras e doídas do mundo. Mas não posso.
É muito duro ser mãe, porque, às vezes, é preciso o algoz da pessoa que você mais ama na vida. É muito ruim fazer o bem sendo ruim. Ruim naquela hora, negadora, cerceadora, não raro apenas observadora - de quando, por exemplo, cai e se machuca depois de ter sido advertido tantas vezes. Ruim para fazer calejar, permitir nascer o bem, o controle, a auto-estima, a força, a confiança, a percepção de si e do outro. Ruim para nutrir, cuidar, proteger, mas sem alijar.
É duro. Ando dorida. Ando partida. Verduga. Continente contendo o mar bravio que se derrama da infância tempestuosa.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Vivendo na base do monkey payment

Toda vez que eu recebo um convite para socializar com os locais já sei: vai rolar pagação de mico. Ou melhor, vou realizar um lindo monkey payment.
E minha vida é assim, monkey payment atrás de monkey payment.
Começou logo numa das primeiras festas, sendo apresentada a um colega de trabalho do marido com grande prestígio e reputação. Arthur, na época, tinha um ano de pura corrida desequilibrada e a festa era em um salão com um lindo terraço de concreto. Arthur para lá, para cá, quase se esborrachando no concreto, ainda sem plano de saúde para cobrir os remendos que fatalmente seriam necessários em caso de queda. Nisso, marido resolve me apresentar ao figurão do trabalho, e emenda (em inglês, of course): ele é da Holanda. Eu, um olho no gato e outro na missa, tentando ser multitarefa em duas línguas, duas realidades, com duas pessoas, em duas velocidades (moço importante parado, me olhando; Arthur correndo e cambaleando), não entendi Netherlands. Fiquei só com o fim da palavra e concluí que era London. E lasquei um "Eu amo Londres" para o moço de Amsterdã.
Foi aquele climão, sabe?
Eu nem me liguei porque quando entendi o que tinha acontecido já estava do outro lado do terraço, com Arthur catando do chão um bolinho amassado.
Rio até hoje disso e faço questão de contar para as pessoas, afinal, quem não ri de si mesmo não é feliz.

Pois bem, as demais interações sociais com locais e em língua em inglesa, confesso, não melhoraram tanto assim de lá para cá. Estou sempre parcialmente na conversa, seja porque me perdi naquela expressão idiomática que desconheço, ou porque achei super interessante a maneira como a pessoa pronunciou uma palavra que eu só conhecia escrita, ou ainda porque Arthur está tentando escalar um muro ou lambe o vidro da janela com gosto.
Por isso, quando recebemos o último convite, já coloquei na bolsa o cheque com o qual pagaria o mico da vez.

Tudo corria bem. Fiz piada engraçada, ri na hora certa, acompanhei até fofoca! A dona da festa falava na velocidade 5 da dança do créu, mas eu ia no ritmo, acompanhando bonito, toda orgulhosa.
=)
Até que... (sempre tem, né?) bateu aquela vontadinha de fazer xixi. Fui ao lavabo da casa, que àquela altura da festa se encontrava bezuntado de sorvete de chocolate derretido e cobertura de marshmallow do bolo recém-cortado. Preocupada em não babar a camisa querida que escolhi usar, fui fechando a porta cuidando tentando não esbarrar nos restos de comida espalhados por ali, na pia, na parede, até mesmo na tábua do vaso. Fechei a porta e procurei, então, a tranca. Não havia. Hum, pensei, melhor fazer um xixizinho bem rápido que é para ninguém abrir a porta e me pegar em flagrante. E assim fiz.
Tudo certo, até agora uma festa mico free.
Até que... (sempre, sempre, sempre!) olha, que curioso! A porta não tem tranca, mas fecha bem fechada! Vou girar a maçaneta e puxar que ela vai se abrir com um clique e... não. Não abriu. Vou tentar o outro lado, sentido horário agora. Nada. Oquéi. Vou puxar apenas. Nem um milímetro.
Por obra do acaso, entrei com o celular no banheiro! E não titubiei em ligar para o marido, que atendeu descrente e um tanto amedrontado.
- Alô?
- Marido, tô aqui no banheiro. Presa. Me ajuda?
- Claro, peraí.
A maçaneta gira em falso também pelo lado de fora.
Ligo novamente, já que o barulho da festa não o deixa me escutar através da porta:
- Marido, empurra a porta, para ver se ela abre!
CREK!
- Ártemis, vai quebrar a porta!
- Deixa. Melhor avisar ao dono da festa. Eu posso sair pela janela, mas não quero deixar o banheiro trancado, né?
- Tá. Pera.
Marido foi, mobilizou: dono da festa, dona da festa, mãe da dona da festa, uns três convidados adultos e dois convidados infantis curiosos com aquele aglomerado de gente grande em torno de uma porta.
Eis, então, que resolvi puxar a porta, uma última vez, vai que...
POC
A porta se abriu e me senti, de repente, no programa Silvio Santos, abrindo a porta da esperança e dando de cara com ela bem cheia: todo mundo ali, resgatando a brasileira presa no banheiro que não tem tranca. Senti o alívio dos anfitriões por não precisarem chamar alguém para desmontar a porta. Senti o alívio do convidado que aguardava, pacientemente, que eu saísse para usar o banheiro. Mas, acima de tudo, senti uma vontade quase incontrolável de gritar para o marido "Eu amo Londres!".
Mas resisti bravamente, sorri, acenei, agradeci e assinei o cheque.

Monkey payment do evento: 

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Ney, Murda e outras pirações

Eu estava tensa. Acabara de descobrir que o Ney Matogrosso era o primeiro homossexual brasileiro a fazer a transformação para virar um autômato. Na tevê, ele, o Ney, se preparava, então, para fazer mais um salto sobre a trave. Fazia parte de sua apresentação, ele estava acostumado, mas ainda assim eu estava nervosa. O fato de estar dando uma entrevista para a Murda* ao mesmo tempo em que reproduzia com exatidão os movimentos de Ney não contribuía para que relaxasse. Observava a posição dos pés dele para imitar, enquanto me perguntava como seria essa transformação, já que nunca conheci um autômato que não tivesse nascido assim, e também tentava me concentrar na pergunta da entrevista. Mergulhei as mãos em uma bacia de amido de milho. Ney se preparou. O amido é suave e adstringente ao toque. Ele sobe, surpreendentemente ágil e forte para a idade. Amo o Ney! Eu subo. Murda aguarda minha resposta. Ney se prepara para atravessar a trave em uma pirueta coreografada. Eu tento, mas não consigo dar uma estrela e sinto uma dor lancinante na coluna. Acordo: com fome, toda torta na micro cama do meu filho e muito pau da vida porque não fiquei sabendo se o Ney conseguiu terminar o show sem se machucar, nem o que comentou sobre se transformar em um autômato, muito menos o que eu ia responder para a Murda. E pior: provavelmente passarei o restante da madrugada tentando me lembrar - sem sucesso - qual será que era a pergunta da Murda.
Então, leitorxs, muito cuidado na hora de escolher o livrinho que vão ler para o filhote dormir, mas mais cuidado ainda para não dormir sem perceber. A próxima vítima da Murda perguntadora ou do Ney autômato pode ser você!

*Murda é um monstro inventado por Shel Silverstein em seu Fuja do Garabuja, que foi nossa escolha para a hora de ir dormir.

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Ajudinha

Queridxs leitorxs, será que eu poderia pedir uma ajudinha rapidinha?
=)

Estou fazendo uma pesquisa, para um projeto, e ficaria muito feliz se vocês respondessem a este questionário sobre blogs maternos que, prometo, não tomará mais que cinco minutinhos do seu tempo.

http://goo.gl/forms/Su7nHFdPTS37BF5C2

Brigadinha!

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Nosso primeiro 4 de julho

Três anos aqui e nunca calhou de estarmos nos EUA naquele que, talvez junto com o Thanksgiving e o Halloween, seja O feriado deles.
Mas este ano resolvemos fazer algo diferente e, como não temos piscina mas temos um pimpolho (não dá para beber muitos bons drinques, portanto), fomos ver a programação da cidade para o dia da independência norte-americana.
Felizmente, pude constatar com bastante alívio, não havia invasões alienígenas programadas, então achei que poderia ser bacana fazer passeios ao ar livre, já que a previsão era de mormaço e tempo nublado, mas sem chuva.
A ideia era acordar, ir ao parque, onde haveria muitas brincadeiras e diversão, depois voltar para casa, almoçar, tirar uma sonequinha, assistir à parada, voltar para casa, jantar e ir para a beira do lago assistir à banda e à queima de fogos.
Acontece que that's my life, neam? E qual é a principal lei de Murphy? Se uma coisa puder dar errado, dará.

Então, pega aí seu cachorro quente, seu refresco Tampico, seu Pop Tart e senta no gramado para acompanhar a saga.

E clica aqui, ó, para entrar no clima:

Acordamos todos felizes (depois da dose cavalar e diária de cafeína para os adultos) e iniciamos os trabalhos diários, a saber, brincar de Lego até você querer jogar todas aquelas porras daquelas pecinhas microscópicas no lixo ou o almoço ficar pronto, o que acontecer primeiro.
Nove horas tocou o telefone aqui em casa. Odeio telefone. Nunca é notícia boa. E, de fato, não era. Na verdade, era uma notícia bem triste. Bom, faz parte da vida adulta com filhos seguir em frente, apesar das más notícias, fingindo que tudo está melhor do que realmente está.
Com isso, nossa ida ao parque parecia fadada ao fracasso antes mesmo de conseguirmos tirar os pijamas. Mas a gente não desiste e, com muita lábia e jogo de cintura, consegui arrastar Arthur para fora de casa (e para longe dos Legos).
As atividades começavam 9h30. Eram 10h41 quando chegamos ao parque. Conseguimos ver as duas últimas duplas de pais e filhos jogando ovos uns para os outros e o coordenador do evento agradecendo a presença de todos, até o ano que vem. Pelo menos ainda tinham umas fatias de melancia e torta de cereja. Arthur comeu as duas coisas e quis ir brincar.
Estava eu testando minha musculatura femural em um eterno para-cima-para-baixo na gangorra com Arthur quando me lembrei que: Putz1) acabou o arroz lá em casa! e Putz2) esqueci a carteira em cima da mesa! Qual a solução? Isso mesmo: catar moedinhas no fundo da bolsa e ir rezando para o mercado.
Assim fomos. Achei umas merrecas em moedas soltas pela bolsa. O arroz custava menos que as merrecas e, felizmente, consegui comprar o arroz sem precisar passar pelo constrangimento de cancelar a compra por falta de verba.
Em casa, tudo parecia prestes a entrar nos eixos, então fui fazer arroz, almoço pronto porque cozinhei um pratão ontem, que teve sobras. Arroz pronto, abri a geladeira e cadê a comida? Marido, como se avisasse que viu um balão no céu, informa que comeu a comida toda ontem mesmo.
E agora? 
Improvisei.
Almoçamos. A ideia, lembrem-se, era tirar uma sonequinha e depois ir à parada, voltar, jantar e ir, enfim, para o lago.
Acontece que as sonecas aqui são recebidas como um convite para a amputação de um membro sem anestesia: dor, sofrimento, negação solene e veemente. Pior coisa. Seguida logo de perto por: cortar unhas, cortar cabelo, escovar dente, colocar roupa para sair, tomar banho, sair do banho, almoçar, arrumar o quarto, jantar, colocar pijama, ir ao mercado, ir ao clube, ir ao parquinho, ir ao médico, ir ao dentista, ir ao trabalho do pai etc. E não necessariamente nesta ordem.
Depois de muito choro e ranger de dentes, dormiu! Ufa! Deitei ao lado dele, para aproveitar a sonequinha e... acordei com um puta susto quando marido me informa (e também o céu lá fora) que já eram perto das seis da tarde. SEIS da tarde. Uma singela sonequinha de quatro horas!
Lembram da parada? Esqueçam, então. Não será desta vez que farei um relato dela. Lembram do jantar? Esqueçam também. 
O jeito foi juntar uns cacarecos aqui e partir para o lago. A ideia era fazer um piquenique frugal e esperar pela queima de fogos, programada para nove e meia da noite. Arthur sugeriu: vamos levar minha barraca! (A barraca dele é uma tenda tamanho criança de 2 anos, dentro da qual ele não cabe mais em pé.)
A barraca dobra, é festa, qualquer coisa é só não abrir a dita cuja e fingir que nada aconteceu: OK. Pega a barraca. Pega o piquenique frugal. Pega manta para sentar em cima. Pega casaco, porque, afinal, isso aqui é Chicago.
Já era a hora do crepúsculo e encontramos diversas famílias indo para a mesma direção que nós. Adoro esse clima de coletividade que existem em algumas festas aqui! Me emociona mesmo ver as pessoas cumprimentando umas às outras, sendo simpáticas e colaborativas.
Quando finalmente chegamos ao lago...

Skol latão um é três, dois é cinco.
Bróder! Quanta ingenuidade e amadorismo da nossa parte!
As pessoas vieram com mesas, cadeiras, carrinhos abarrotados de comida e geladeiras portáteis recheadas com refrigerantes, cervejas, águas, vinhos e até mesmo cafés gelados. E não só! Ao nosso lado tinha uma senhorinha muito fofa e simpática que montou uma mesa com toalha, vasinhos com flores e velas! Me senti num piquenique na Lagoa, fiquei esperando o tio do Skol latão passar, até porque mais adiante tinha uma galera fazendo um churrasquinho e havia um bando de camelôs vendendo sabres de luz de todas as cores e formatos ( (!) juro! tinha um com uma estrela na ponta). E nós ali, singelamente, abrindo uma tenda tamanho 2 anos, com um colar luminoso (que comprei por um dólar no mercado, crente que estava abafando), uma manta e dois potinhos, um com pretzel e outro com framboesa para o nosso lanche frugal. 
Marido se empolgou ao ver que os velhinhos à nossa direita estavam bebericando vinho gelado e resolveu: vou sair e comprar uma bebida para nós.
Assim que eu gosto! Foi com esse homem que me casei!
Ele foi.
Arthur ficou matando a população do entorno de fofura e eu fiquei esperando. Beliscando minhas framboesas.
Foi quando me dei conta de que framboesas pelas próximas duas horas + euzinha que sou chegada num desmaio por hipoglicemia não seriam uma boa combinação. Mandei, então, um torpedo (alguém ainda manda torpedo?) para marido e pedi um alimento.
Vinho, comida e um gramado para o meu bólido correr e pular sem incomodar o vizinho. Isso é que é vida, pensei. Ainda tem uns camaradas ali adiante, com uns instrumentos, tocando altas músicas maravilhosas. Ah, que beleza. E foi mesmo uma beleza por vinte minutos. Depois meia hora. Quarenta minutos. UMA HORA E VINTE.
Começou a tocar a marcha imperial. Arthur pirou. Incorporou o Darth Vader e achei que fosse fazer a senhorinha simpática do nosso lado infartar de ternura. Ele marchava para um lado, e para o outro. Parava, fazia caras e bocas.
E marido nada!
Os músicos continuaram no tema Star Wars (não entendo nada, então só acredito no que foi dito antes de começarem a música, posto que não reconheci nem um acorde sequer daquilo). E nada de marido.
Foi quando ele voltou, já no fim da apresentação da banda/orquestra, com uma sacolinha mixuruca da farmácia na mão. Opa! Na farmácia não tem birita.
Pois é: tudo fechou e a única coisa aberta nas redondezas era a farmácia. Marido voltou com dois sanduíches pré-embalados estilo posto da Dutra ou lanchonete da faculdade, uma mini garrafa de suco de laranja (sem vodka dentro, que fique claro) e um iogurte sem colher.
Mas, para não dizer que não houve ostentação em nosso feriado, voltou também com um sabre de luz para o nosso pequeno Jedi, que correu, pulou, marchou, lutou e quase acertou a cabeça de umas 798 pessoas.
Ficamos ali, esparramados na grama, até a hora da queima de fogos.

Pou! Pou! Pou!
POU!
Eu, garota carioca suíngue sangue bom, já vi Copacabana, né? Então nada no mundo deve ser impressionante para mim no quesito concentração populacional + queima de fogos. Mas foi legal. Tinha uma caixa de som tocando umas músicas variadas (de Frank Sinatra a Bon Jovi, de Van Halen a Tchaikovsky) e que os fogos tentavam acompanhar.
Chegamos em casa perto das onze da noite e ainda precisei esfregar estes pés.

Cruzes!
Daí, que depois de tudo isso, depois, inclusive, de lavar a criança, Arthur me olha nos olhos, onze da madrugada, e diz: mamãe, quero comer macarrão!

Ainda bem que é só uma vez por ano!

terça-feira, 5 de julho de 2016

Arte de fogo

- Mamãe, a gente vai poder fazer arte de fogo?
- Ih, filho, não sei o que é isso, mas me parece meio perigoso, né? Não quer brincar de massinha?
- Ah...
Marido intervém.
- Ártemis, acho que ele quer dizer outra coisa.
- É? O quê?
- Mamãe, arte de fogo, aquilo que brilha.
- Que brilha?
- Ahhh - marido é, então, iluminado. - Fogos de artifício, Arthur?
- É! Isso!

Amanhã volto para contar como foi nosso primeiro 4 de julho em terras norte-americanas cheio de arte de fogo.
;)

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Entrevista com Arthur

Está rolando na internet uma brincadeira muito fofinha, que consiste em uma série de perguntas feitas às crianças e suas respostas espontâneas e muitas vezes engraçadas. Entrevistas são maneiras dinâmicas e divertidas de fazer um registro do momento de vida e podem render muitas surpresas. É bacana também repetir a entrevista algum tempo depois, para ver o que mudou, o que permaneceu e como sxx filhx vê o mundo.
Não resisti e fiz com Arthur.

Qual seu nome?
Começa com A. Arthur.

Quantos anos você tem?
4.

Quando é o seu aniversário?
Foi outro dia.

Quantos anos tem o papai?
Não sei.

Quantos anos tem a mamãe?
Não sei.

Qual sua cor favorita?
Azul.

Qual sua comida favorita?
Macarrão.

Quem é o seu melhor amigo?
Foster!

Qual seu programa favorito?
Todos.

Qual sua música favorita?
Arca [de Noé, do Vinicius de Moraes].

Qual seu animal favorito?
Cachorro.

Onde você mais gosta de ir?
Children's Museum [tipo um parque indoor aqui em Chicago].

O que você quer ser quando crescer?
Um papai.

O que a mamãe mais gosta de fazer?
Me abraçar.

O que o papai mais gosta de fazer?
Brincar.

Do que você mais gosta de brincar?
Star Wars.


E vocês, já fizeram com os filhos de vocês? Que outras perguntas fariam?

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Quase um cachorro

Poizé, povo.
Nem só de desmaios vive esta pessoa aqui.
Também vivo de limpar gaiola pelo menos três vezes por dia. Também vivo de dar alface, feno e ração e também de soltar a pobre bichinha pela casa (e depois sair limpando xixis e cocôs infinitos).
Coelho é um bicho muito fofo, mas que faz tanto cocô quanto um RN em livre demanda. Só que sem fralda. Faz EC com ela, Ártemis, dirão as pessoas mais fanfarronas. Rá rá rá. A verdade é que coelhos são fofos e lindos, mas, sinceramente, prefiro cachorro. Cachorro abana rabo quando você chega, obriga você a passear e ver o mundo todos os dias, dorme enroscado com você sem fazer xixi e cocô na cama e ainda atende quando você chama. Porque Jessie não atende. Já tentei os mais variados sons e gestos, até mesmo um suborno com suculentas folhas de alface, sem efeito. Agora, fiquei muito surpresa com outras duas coisas (além do cocô abundante e onipresente): coelhos fazem barulho e coelhos lambem você!
Jessie, especialmente, é muito carinhosa e outro dia veio ficar no meu pé enquanto eu embalava Arthur no colo. Uma fofura! Sempre que eu a solto, ela me procura e tenta ficar perto. Não é raro ela se deitar rente a meu pé ou perna e ficar ali. Aceita carinho e é infinitamente menos arredia que Lola, a porquinha-da-índia que hospedamos ano passado.
Ontem estava limpando a gaiola (pela terceira vez no dia), meio de saco cheio, confesso, pensando que puta saco é isso de ficar limpando bolinhas de fezes e jornal xixizado, espargindo grama seca e enchendo potinho de ração quando me lembrei de uma coisa que mudou a maneira como passei a encarar tudo isso. Na escola do Arthur, cada sala tem bichinhos diferentes. Na dele são Jessie, Blue (um beta) e a tartaruga (esqueci o nome). Mas na sala da amiguinha dele, tem um sapo. Um sapo! Que com certeza está na casa de um voluntário, sendo alimentado e cuidado sabe-se lá como. Um sapo que fez Jessie parecer ainda mais fofa e interativa. Quase um cachorro.
Acho que estamos indo bem, portanto.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Emoção, de novo

O microfone anunciou: a biblioteca vai fechar dentro de quinze minutos.
Quem primeiro ouviu isso, ao que parece, foi meu estômago, não o ouvido. Isso porque, ato contínuo, comecei a sentir a barriga roncar. E quando minha barriga ronca, na mesma hora, meus dedos dos pés e das mãos ficam gelados e eu sei que dentro de poucos minutos (dois, três?) eu irei desmaiar.
Então, saí correndo. Passa cartão, passa livros no scanner, enfia tudo dentro do carrinho, vamos embora! Lá fora, sol intenso e trinta e três graus.

Chego ao caixa. Não me lembro bem de como atravessei a rua, entrei no supermercado, verifiquei as opções de comida e escolhi o que queria. Todas as minhas energias estão voltadas para três coisas: Arthur, não desmaiar e grunhir coisas minimamente inteligíveis para a moça que está me perguntando alguma coisa pela segunda vez.
Oi?
Ela, incrédula, tenta de novo: "Isso é SOPA?"
Aqui reverbera dentro de mim: SOPA, SOPa, SOpa, Sopa, sopa.
É. É, sim. Sopa.

E foi assim que tomei uma sopa bem quentinha no verão estadunidense e, mais uma vez, evitei um desmaio, mas não o vexame.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

4 anos

Há quatro anos que este é o dia mais maravilhoso do ano!
Que haja sempre saúde, respeito, paz e harmonia para comemorarmos muitas e muitas vezes esta felicidade!

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Jessie is in the house!*

Eu tenho um conselho, amigxs: se forem ler e-mails, não bebam.
Se alguém tivesse me dado essa maravilhosa obra de arte em forma de advertência, provavelmente, eu ainda conservaria uma parte de minha sanidade.
Tudo começou quando marido e eu resolvemos abrir um vinho ANTES do jantar. Dia difícil, sabem? A gente bebeu feito adolescentes e, quando foi comer, já estávamos bêbados. Nada demais, é verdade. Não caímos, não embolamos a língua, mas estávamos indiscutivelmente bêbados.
Então marido comentou:
- Você viu o último e-mail das professoras do Arthur?
Eu não tinha visto e fui com ele até o computador. Lemos. E decidimos:
- Claaaaro! Responde aí pra elas que a gente pode ficar, sim, com a Jessie.
Porra. PORRA, vinho!
Jessie é a coelha anã que mora na sala de aula do meu filho. Durante o verão, quando a escola entra em recesso, os bichinhos das salas são despachados para diversos lares de otários, digo, voluntários. Ano passado nós, sóbrios mesmo, ficamos com a porquinha-da-índia doente (não sabíamos, óbvio, que ela estava doente). E este ano, o quê? O quê? O quê? Resolvemos beber e responder e-mails e ficamos com um coelho na sala.
Sabem aquela piada do rapaz que está desesperado com a vida que leva e, ao se consultar com um sábio, é aconselhado a colocar um bode na sala? Tudo questão de perspectiva, carxs. Tudo perspectiva.
Agora estamos aqui, nós três e o coelho. Preciso de mais vinho.



* Jessie está no pedaço!

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Vamos falar sobre amamentação?

Eu estava grávida, sentada no banco de carona de um carro, quando a irmã de um amigo meu, irmã que eu mal conhecia, que tinha visto de relance umas duas vezes na vida, veio correndo do outro lado do estacionamento e gritou, segurando o cachorro pela coleira:
- Olha, amamentar dói! Mas ó: não desiste, não.
Outro dia, Arthur recém-desmamado, encontrei com ela. Comentei o quanto aquela frase foi importante para mim, agradeci e segui caminho.
Realmente, amamentar pode doer no começo. Para mim, doeu muito. Doeu até Arthur ter mais de 1 ano. Doeu constantemente. Doeu de eu precisar ir ao IFF, me consultar com uma fono especializada em amamentação, de eu tomar analgésico de 8 em 8 horas. Eu, que pari sem anestesia, amamentei na base da sedação, porque eu chorava de dor.
Tem gente que não sente nada? Amiga, se tem gente que vota no Bolsonaro, por que raios não teria gente que amamenta sem dor? Tem gente que gosta de coentro. Tem gente que dá à luz sem nem sentir contração. Tem gente que não gosta de chocolate. Claro que tem gente que amamenta sem sentir nada, que dorme junto do recém-nascido enquanto ele mama, que acerta de primeira todo o processo e pronto. O mundo tá cheio de gente de todo o tipo.
Eu costumo falar isso para as grávidas que me perguntam da amamentação: que amamentar pode doer, que é melhor se informar, se preparar, que eu vou torcer para ela não sentir nada, nada, mas que se sentir, toma aqui o telefone do IFF, também pode procurar outro hospital com banco de leite, anota aí o site e o telefone da fono que me salvou, não esquece de ler este relato e o livro que vou indicar. Boa sorte, vai lá, tudo de bom, boa hora!
Nas reuniões que participei do grupo Amigas do Peito, falava-se em apojadura (descida do leite), pega correta, adaptação do terceiro mês e vida que segue depois que tudo entra nos eixos. As consultoras da La Leche League comentaram comigo sobre monília (cândida/fungo no seio) e ordenha para estocar leite quando voltando ao trabalho. O IFF me ensinou ordenha manual, pega, como lidar com um cisto doloridíssimo que tenho, como observar ganho de peso e se está havendo a ingestão correta de leite. O pediatra do meu filho me instruiu sobre a dieta que eu deveria fazer para ele parar de vomitar em jatos. E foi assim que, depois de tantas consultas e profissionais envolvidos, eu achei que aos seis meses eu estaria expert em amamentação, fazendo tudo com os pés nas costas e que, ai, mal posso esperar para amamentar enternecida de amor e achando aquilo a coisa mais divina e maravilhosa do universo inteirinho!
Acontece que havia dois erros neste raciocínio. O primeiro é totalmente imprevisível. Eu poderia ser das pessoas que não gostam de chocolate e não sentem dor para amamentar, mas sou das chocólatras e fui das que sofri MUITO para amamentar. Dores, dores, dores e mais dores. De todos os tipos, intensidades e origens. O segundo erro é sobre o que eu realmente quero falar neste post.
As pessoas costumam achar que amamentação pressupõe um desenvolvimento linear e progressivo da técnica e do prazer ligado ao ato. A grosso modo, talvez seja assim, sim. E, novamente, quem sabe para aquela sua prima do interior que não curte sorvete isso tenha sido exatamente desse jeito.
Mas o que vejo acontecer com muita frequência são mães que estão amamentando prolongadamente (acima dos seis meses) e que começam a desejar ardentemente o desmame. Ninguém fala para a gente que amamentar também enche o ovário! Que amamentar um ser que tem dentes pode ser um desafio (como ensinar para um bebê de sete meses que aquele barulho engraçadíssimo que ele provoca é, na verdade, o grito esganiçado da mãe que acabou de perder um pedaço do mamilo?). Amamentar pode ser tedioso, pode ser penoso, pode ser desgastante e até mesmo angustiante. O ato de amamentar não é um gráfico em linha reta que, conforme vão passando os meses vão aumentando o prazer e a alegria de amamentar. Não! Amamentar pode exigir que você volte ao banco de leite ou que ligue para a consultora de lactação aos nove meses do pimpolho, porque nem você, nem ele sabem o que fazer com tanto dente naquela boquinha. Amamentar pode ser tão desconfortável à noite ou quando você gostaria de estar fazendo qualquer outra coisa durante o dia que você quer desmamar agora, 1, 2, 3 e já! Amamentar pode ser desafiador e trazer doencinhas ou incômodos realmente importantes. Pode fazer você desenvolver tendinite, travar coluna, dar dor de cabeça por tensionamento dos músculos das costas e pescoço, pode levar a uma condição clínica de falta de vitaminas ou minerais. Amamentar é difícil para caraleo! E pode estar tudo bem no mês 3 e, de repente, no mês 8 dar uma vontade horrível de desmamar logo. Aí você aguenta mais um pouco porque a OMS recomenda amamentar até pelo menos 2 anos e no mês 10 tudo volta a ser delicioso. Até que entra o mês 14 e você tem vontade de jogar a toalhar de novo. E assim vamos, nessa montanha-russa de sensações, emoções, vontades e habilidades.
Mas ó: não desiste, não! Quando você achar que já chega, basta, respira fundo, pensa se é isso mesmo que você quer ou se só está cansada, frustrada e desestimulada. Se for para desmamar, que seja pelos motivos certos. E esses, você sempre sabe quais são. Caso contrário, pensa que eu sou a irmã do amigo com o cachorro na coleira: não desiste, não!
;)