terça-feira, 4 de março de 2014

Luz

A noite vai quase alta, e estamos sozinhos em casa. Telefono para marido e pergunto que horas ele vem. Vai demorar ainda. Resignada, vou agitar a vida, colocar o menino para dormir, organizar o dia que virá. Tiro a calça para entrar no banho.
Toc toc toc.
Não acreditando no que ouço, paro, aguço a audição e escuto novamente.
Toc toc toc.
Marido não é. Acabou de desligar e não vinha antes das onze. Amigo não é. Não conheço quem venha sem avisar e ninguém tocou a campainha lá de fora.
Toc toc toc.
Insistente.
Toc toc toc.
Assalto? Fogo? Polícia? Quem entra no prédio sem tocar campainha/interfone? Pedinte? Senhorio? Paramédicos? Quem está no prédio? Vizinho pedindo açúcar? Parente que ficou preso do lado de fora do apartamento? Engano? Quem? Correios? Entrega? Pizza?
Visto a calça, ajeito a blusa, encaixo Arthur na anca.
Nhéééééé.
A porta se abre, misteriosa e lentamente, o ranger soando afinado com meu coração disparado, histérico, fantasiando mil histórias e desfechos. Do outro lado, no corredor, a japinha loira que mora no andar de baixo. Sorridente, lápis e papel na mão, leva embora o que restava da minha sanidade ao perguntar:
- Sua conta de luz aumentou no último mês?

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