segunda-feira, 2 de maio de 2016

A referência do sol

O relógio marca duas da manhã. Estou indo dormir, mas antes de fechar os olhos dou uma olhada no aplicativo de previsão do tempo porque preciso saber em quantas camadas minha vida será vivida dali a algumas horas. Três anos morando aqui e tenho a impressão de que qualquer coisa pode acontecer fora do inverno: frio, calor, chuva, neve, granizo. Porque no inverno não existem muitas dúvidas, né? Só uma gradação que aqui, geralmente, fica entre o aturável e o desagradável. Frio.
O relógio marca duas da manhã e o termômetro, doze graus. Abro a previsão hora a hora porque sei que aqui o sol não funciona como no Brasil.
Perdi a referência de um saber corporal que nem passava mais pelo plano racional: vento quente, lá vem chuva; se vai sair à noite, casaco; se vai acordar antes de o sol esquentar, frio; sol a pino é calor.
O sol está lá no alto como uma lâmpada fluorescente. Não amorna o dia em sua trajetória elíptica rumo ao poente. Não deixa o frio para a lua. E bagunça a sensação de que prata é fria e bronze é quente. O dia segue seu rumo sem se importar com o sol, mero coadjuvante em um ato estrelado por ventos e nuvens e águas.
Olho para saber a temperatura porque perdi a referência do sol, e aqui, apesar de estranho, é cotidiano que as temperaturas sigam ao sabor de inomináveis e misteriosas trajetórias da Terra ao redor do brilhante vazio.

Um comentário:

  1. Ai, tô te invejando =D
    se eu te contar que amo o frio, vc acredita?!
    bjss

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